Andei o dia todo - nos pedacinhos livres - a pensar no que havia de escrever aqui hoje. Todos os assuntos me pareciam inapropriados ou sob uma abordagem entediante.
Claro, eu sei que não tenho de escrever (o tenho estava sublinhado, viram?), mas já me sinto na obrigação de o fazer.
Obrigação, não, se formos honestos, a obrigação é mesmo só com o meu ego, que tem esperança de se saber lido, comentado, merecedor de atenção. (Porque é que não há uma palavra feminina para ego? Fazia todo o sentido).
Enfim, como quero muito encontrar um assunto e uma prosa merecedora de comentários elogiosos - zás! - bloqueei.
Armada em estrela, achei que não tinha material para manter o nível. Pfff! Até para mim estou a ficar insuportável e, como diz aquele anúncio «se eu não me suportar, quem me suportará?». Creio que não é bam assim, mas a adaptação não saiu mal.
Bem, então, recordei-me de uma crónica magnífica de Carlos Drummond de Andrade, escolhida pelos escritores do Sinusite Crónica para o início e o fim desse blogue, de que eu tanto gostava.
Como não tenho a mesma arte do Drummond de Andrade e qualquer imitação seria de mau gosto, «postei» a crónica toda no Salvo Seja - que vos convido a ler - e vim aqui só para dizer que hoje não escrevo.
11 comentários:
Não é para contar uma estória que tu escreves
Não é para contar uma estória que tu escreves
e eu pinto
nem para nos apontarem a dedo que limamos
o bico aos pregos no avesso do mundo, nem a terra
é o centro deste. O universo não usa
adereços de cena
nem liga a espelhos. Tem mais que fazer
que nos copiar e tão-pouco ao fado pois ele é
velho, não tem dentes, e tresanda
ao ranço de uma açorda
salgada e sem coentros.
Júlio Pomar
Sim, apoiado, não é só para contar estórias... Há que pensar nos fás, nas responsabilidades da fama! Não queira ficar apenas com os louros...
A Escrivaninha não escrever é quase tão mau (ou mais?) que uma açorda salgada sem coentros.
também era para não escrever, mas depois reconsiderei - há uma palavra feminina para ego: ega, pois claro! ;)
Ah! Caríssimos: Agora é que eu fiquei com «a ega lustrosa»! :-)
Vou tentar a continuar a corresponder às expectativas. Obrigada!
Por causa do ego e da ega, lembrei-me daquele senhor que achava que as epístolas eram as mulheres dos apóstolos.
Escrevemos docemente
Escrevemos docemente. Se a figura
sobe de estar tão funda a essa mesa
é que escrever se lembra. E só da altura
de se lembrar percorre a linha acesa
a ponta de escrever, que traça a pura
forma de rosto que abre na tristeza.
E a tristeza ilumina de escultura
penumbras de volumes com que pesa.
Por isso é docemente que da linha
de estar ali aonde sempre esteve
aparece figura de rainha
que sempre foi e agora só se escreve.
E escrevermos é como se na vinha
o sol se iluminasse. E fosse breve.
Fernando Echevarría
Isso: ilumine a Escrivaninha o sol na nossa vinha...
Se os apóstolos abandonaram mulheres e filhos para seguirem o JC, as mulheres deles passaram todas a ser "ó espera por ele!".
Quando eles escreviam as epístolas era de longe e para outras mulheres...
Belos exemplos de vida familiar!
Escrevo como quem quer ser escrito
escrevo como quem quer ser escrito
uma árvore ou uma pena no centro da frase
um espelho branco onde observo a palavra
e dos seus troncos brotam folhas, letras
inundações de verde no lago azul do céu
que caem, voando, asas de papel
como tu, também eu sussurro
lentas sílabas à leve melancolia que nos abraça
Jorge Reis-Sá
julga que inventei?
então não se lembra em «os maias» do melhor amigo do carlos, o ega?
;)
.... e também não é preciso morar na rua sésamo para saber que as melhores amigas das becas são as egas... ;)
Mestre:
É uma bela imagem para um espaço virtual: Abraçados melancolicamente numa vinha ensolarada por palavras?...Gosto!
jl
parafraseando alguém: rabd!
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