quarta-feira, 28 de março de 2012

Obituário

Vários dias sem passar por aqui, banhada no rio de papeis que sobe de caudal em cada época de avaliações e o que tenho obrigatoriamente que registar aqui hoje são duas tristes notícias: o desaparecimento de dois mágicos das palavras.

Por estes dias morreram António Tabucchi e Millôr Fernandes.

Continuaremos a frequentá-los, amigos.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Arma Secreta

"Tenho uma arma secreta
ao serviço das nações.
Não tem carga nem espoleta
mas dispara em linha recta
mais longe que os foguetões.


Não é Júpiter, nem Thor,
nem Snark ou outros que tais.
É coisa muito melhor
que todo o vasto teor
dos Cabos Canaverais.


A potência destinada
às rotações da turbina
não vem da nafta queimada,
nem é de água oxigenada
nem de ergóis de furalina.


Erecta, na noite erguida,
em alerta permanente,
espera o sinal da partida.
Podia chamar-se VIDA.
Chama-se AMOR, simplesmente."

António Gedeão

O poema que eu li hoje aos meus meninos (e fui aplaudida).
Dia Mundial da Poesia

terça-feira, 20 de março de 2012

Porque é que a Primavera chegou mais cedo?

segunda-feira, 19 de março de 2012

Dia do Pai

«Mamã, quando eu ser papá, compras-me um cachimbo?», terei dito, muito pequenina, quando contemplava a coleção de cachimbos do meu pai.
Nunca fumei cachimbo, nunca fui papá, mas recordo-me uma criança engraçadinha...e já com um sentido prático: vejam lá se eu queria ser mamã e pedi uma mini-bateria de cozinha? Safa! Estar no cadeirão a fumar cachimbo tinha um ar mais apelativo.

domingo, 18 de março de 2012

Encontros com Amor II: A admiração mútua de Maria Helena e Arpad

"Arpad Szenes e Vieira da Silva conheceram-se pois, nessa Paris, corria o ano de 1928, quando ambos desvendavam as linhas da pintura e da escultura da Academia Ranson, nos cursos de Bissière (...).
A admiração de Helena, despertada aquando de ouvir o humilde aspirante a pintor ensaiar breves frases que explicassem o desenho em que, então, trabalhava, haveria de ser retribuída um ano depois, quando Arpad, regressado de uma estada na cidade natal, se impressionaria profundamente com os incríveis progressos encetados pela jovem pintora. E essa admiração transmutar-se-ia em amor, numa relação tranquila e duradoura (...)."

Borges, Alexandre, Vieira da Silva e Arpad Szenes: Sensações  da Luz in 1o Histórias de Amor em Portugal, pp. 78-79

sábado, 17 de março de 2012

Encontros com Amor I: Pilar e José

"(...) Ao falar de política, daquilo que, então, acontecia na Europa, deram por si a reconhecer-se um no outro - afinal, estavam os dois no mesmo lugar, na mesma morada do Tempo -, dois comunistas marxistas, desencantados com grande parte do mundo, mas fascinados e salvos, não poucas vezes, pela literatura."

Borges, Alexandre, Pilar del Rio e José Saramago: Para uma segunda vida in 10 Histórias de Amor em Portugal, p. 161

Ementa

Sopa de Nabiças
Pampo grelhado com legumes
Água
Maçã Assada
Café
Duas Histórias de Amor: Vieira da Silva/Arpad Szénes e José Saramago/Pilar del Rio

Tinham quase tudo no restaurante. Eu só levei o livro do Alexandre Borges "10 Histórias de Amor em Portugal".

sexta-feira, 16 de março de 2012

Depois do Escritor

Este escritor leva a questão a extremos, mas, por vezes, interrogo-me sobre a legitimidade de publicar textos que um autor deliberadamente não publicou. Se o próprio autor não os terminou ou não os considerou suficientemente bons, não será uma traição divulgá-los?
Ou será que a nossa crítica tem uma medida especial para textos "imperfeitos" de autores consagrados, que se tornam assim objetos de uma atenção e valorização que não têm a ver com o texto em si, mas com todo um prestígio de um autor? Será justo? Será sensato? Será correto?

A queimada
Queime tudo o que puder:
as cartas de amor
as contas telefônicas
o rol de roupas sujas
as escrituras e certidões
as inconfidências dos confrades ressentidos
a confissão interrompida
o poema erótico que ratifica a impotência
e anuncia a arterioesclerose
os recortes antigos e as fotografias amareladas.



Não deixe aos herdeiros esfaimados
nenhuma herança de papel.
Seja como os lobos: more num covil
e só mostre à canalha das ruas
os seus dentes afiados.

 
Viva e morra fechado como um caracol.
Diga sempre não à escória eletrônica
Destrua os poemas inacabados, os rascunhos,
as variantes e os fragmentos
que provocam o orgasmo tardio dos filólogos e escoliastas.


Não deixe aos catadores do lixo literário nenhuma migalha.
Não confie a ninguém o seu segredo.
A verdade não pode ser dita.


Ledo Ivo

quarta-feira, 14 de março de 2012

D. Vitorina

"Então vizinha?..."
Começavam sempre assim os nossos diálogos.
Tinha o cabelo branco e as costas muito curvadas, mas conservava um sorriso franco e um brilhozinho nos olhos, que não me deixaram nunca perceber que já estava perto dos 80 anos.
Chamava-me "menina", achava muito bem que eu passeasse, comesse fora e não me detivesse com "as coisas da casa", que a vida é para ser vivida.
Sofria porque andava muito mais devagar que antigamente e penso que também ela (como muitas outras pessoas que conheço) não percebia como foi isto de envelhecer, assim...ainda ontem era nova...
Quando a porta se abria, víamos logo as fotografias dos filhos e dos netos: a riqueza dela!
Talvez por isso a fui associando à minha avó (embora ontem tenha percebido que ela nascera na mesma altura que a minha mãe, parece que também estou a perder a capacidade de contar a minha idade).
Às vezes estávamos semanas sem nos vermos - ritmos desencontrados, vidas mais apressadas - mas sabíamos quase sempre uma da outra pois eu estacionava em frente à porta dela. Por vezes ela abria a porta só para me cumprimentar.
Outras vezes encontrávamo-nos no café, onde ela e outras duas senhoras aqui da rua, tomavam diariamente o seu carioca.
Uma das vezes em que nos cruzámos eu disse: Não a tenho visto.
E ela respondeu: pois, temos andado desencontradas. Mas eu, antes de me deitar, espreito aqui pelas tabuinhas e, quando vejo o carro da menina, vou-me deitar descansada.
Talvez por tudo isto eu sinta que ontem enterrei outra vez a minha mãe e a minha avó. Morreu uma pessoa que tomava conta de mim como de uma menina.

segunda-feira, 12 de março de 2012

Hoje vai de amargura...

"Há sempre os que defendem os subnormais na sociedade porque não se dão conta de que os subnormais são subnormais. E a razão por que não se dão conta é que eles também são subnormais. Temos uma sociedade subnormal e é por isso que fazem o que fazem e fazem aos outros o que fazem. Mas é problema deles e eu não me importo, a não ser que eu tenha que viver com eles."

Charles Bukowski (1920-1994)
colhido em http://belasmensagens.zip.net/index.html (se bem que não sei se será uma «bela mensagem»...ou talvez toda a mensagem seja bela quando encontra quem a compreenda...Sim, é uma bela mensagem!)

Choque de gerações

Fim de semana de adolescentes. Uns representados pelos testes sobre a mesa que se adensam em riscos vermelhos, cruzes, sinais de respostas mortas por falta de estudo; outro, o sobrinho que tem de se "empurrar para o estudo", com ameaças, viistas surpresa, reprimendas e todo um rol de indisposições familiares que se evitavam com um pouquinho de atenção ao que se diz e ao que é preciso fazer.
Dantes nao sentia tanto desespero na profissão de professora e na função de tia.
O que mudou?
Fui só eu que cresci?
Tento rebuscar na memória como era quando estudante. Não era nenhum mimo, mas...sabia o que tinha de fazer e nunca ninguém teve de ter tanto trabalho comigo.
Faço o quê? Parece que nem nos devemos queixar... Acusamos fraqueza e passamos mal-estar. Mas eu sinto-me mal, por isso também não me apetece passar outro sentimento. Serei queixinhas, derrotista...derrotada? Assustada, muito assustada com o rumo que isto leva.

"Ah, só

Ah, só eu sei
Quanto dói meu coração
Sem fé nem lei,
Sem melodia, nem razão.


Só eu, só eu,
E não o posso dizer
Porque sentir é como o céu
Vê-se mas não há nele que ver."

Fernando Pessoa

domingo, 11 de março de 2012

Memória em Horas Extraordinárias

Foi hoje (talvez porque é sábado) que fui, finalmente, ao blogue «Horas Extraordinárias» de Maria do Rosário Pedreira, de quem já me têm ofertado por aqui poemas e sobre quem li uma reportagem há tempos no DN.

E lá fui eu, procurando mitigar o sofrimento de ver os testes e recolher-me por um breve tempo em textos que me agradessem ler.

Logo para entrada, o texto mais recente, é sobre um tema que me é tão querido: A memória e o seu carácter muito pessoal. Reproduzo aui o texto:

09 Mar 12Memória e ficção Por Maria do Rosário Pedreira, às 09:33 Esteve de novo recentemente em Portugal a romancista espanhola Rosa Montero, autora dessa obra genial e diferente de tudo o que li até hoje intitulada A Louca da Casa, cuja personagem principal é, no fundo, a imaginação. Levada desta feita a reflectir sobre o peso da memória na ficção, na sua e na dos outros, contou uma história surpreendente que, até certo ponto, complementa o referido livro. Rosa tem um irmão com o qual cresceu e não existe entre ambos grande diferença de idade. Separaram-se naturalmente quando saíram de casa e, porque o irmão veio entretanto viver para Portugal, vêem-se agora muito menos. Quando se encontram, por isso, não resistem a recordar os tempos em que eram pequenos e brincavam juntos na mesma casa. Ouvindo o irmão falar sobre a infância e a vida em família, Rosa Montero ficou, no entanto, completamente perplexa e confessou: «Não é possível que tivéssemos os mesmos pais. Os meus não tinham nada que ver com o que ele recordava.» E, para concluir, avançou com uma proposta bem interessante: «A memória é uma história que contamos a nós mesmos.»

sábado, 10 de março de 2012

Porque Hoje e Sábado

"E depois começou toda esta zorra"
Eu cria (e queria, também) que a idade nos fazia mais sensatos...

sexta-feira, 9 de março de 2012

Paisagem e Destino

Se eu morasse em frente ao mar teria todos os dias vontade de partir.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Gratidão

Gota de água

Eu, quando choro,
não choro eu.
Chora aquilo que nos homens
em todo tempo sofreu.
As lágrimas são as minhas
mas o choro não é meu.

António Gedeão

Dia da Mulher

"Ele esperava-a à porta do emprego.
Entrou no carro e subiu-lhe logo pelas narinas o perfume forte e fresco que ele colocara certamente há pouco tempo. Olhou-o um bocado irritada. Estava cansada e apetecia-lhe embirrar com alguém...(Não teve a consciência disso, mas era a verdade).
Ele inclinou-se para o seu lado. Beijou-a ternurentamente e disse: Feliz Dia da Mulher, meu amor!
- Oh, pá! Estou farta disso! Hoje lá na secretaria vinham todos com falas mansas e alguns até com flores «Feliz Dia da Mulher! Feliz Dia da Mulher!» Que parvoíce! A eles não podia dizer nada. E cara alegre que é serviço...Agora a ti. Bolas! Francamente! Eu não quero um dia da mulher! - rematou olhando-o de forma desafiante.
- E parabéns para ti, que tens direito de dizer o que queres e o que não queres. E de ser ouvida. E de ser bruta e malcriada também. Mas antes de ti houve muitas que por menos do que isso foram espancadas ou mortas. Não achas que deves festejar o direito de ser extremamente indelicada comigo e não sofreres as consequências? - ele despejou tudo isto com um ar limpo e fleumático.
Ele teve a sensação de que ele ensaiara o discurso. Talvez ela fosse mesmo bruta e indelicada. Agora sentia-se envergonhada. Mas não ia pedir desculpas...Não! Ela não!
Ele olhava-a insistentemente e o seu olhar começava a doer. Ela sabia que ele adivinhava a sua luta interna. Não sabia bem como sair daquela situação.
Por fim, com um suspiro entre a irritação e o alívio, atirou: Eu pago o jantar!
E apressou-se a dizer - Sim, sim, e que sorte a minha de ter ordenado para pagar o jantar, porque muitas houve que, mesmo tendo ordenado, não dispunham dele. Deixo-te fazer um brinde à memória de todas elas, mas não me vais dar mais uma aula de História.
Ele sorriu, pôs o carro a trabalhar e mentalmente foi antecipando a forma como comemoraria pela noite fora aquele amor tão difícil."

domingo, 4 de março de 2012

Trocando os tempos

Gosto muito de brincar com os tempos e os ritmos. Gosto de fazer as coisas fora de tempo ou comportar-me ao contrário do tempo.
Por exemplo, gosto de estar de férias quando os outros estão a trabalhar...mas também gosto de trabalhar quando os outros estão de férias; gosto de trabalhar aos fins de semana e tirar uma tarde de semana para ver o mar, ir ao cabeleireiro ou ao supermercado; não fazer compras ao sábado, não ir à missa ao domingo; enviar as fotos das férias de Verão durante o Inverno aos amigos e divulgar fotos de gorro, luvas e lareira em pleno Verão, etc.
Este fim de semana trocaram-me as voltas aos planos que tinha feito. A casa familiar onde planeara passar o fim de semana estava infestada de vírus da gripe e a prudência e os avisos dos engripados, devolveram-me ao sossego e segurança do lar.
Ontem acabou por ser dia de iniciativas culturais e de amigos, intervalados com algumas arrumações. Hoje a continuidade das arrumações e o tempo cinzento exigiam medidas de sofá. Uma consulta rápida às gravações feitas na 'box' da Cabo mostraram-me que entre vários filmes e séries, estava o filme 2012, que dera na alturas do Natal, época em que não me apetecera enfrentar as profecias fatalistas dos Maias reintrepretadas pelos cidadãos americanos atuais.
Foi hoje, dois meses que o ano já tem. Afinal a profecia aponta para 21 de Dezembro de 2012, mas, como não podia deixar de ser, os americanos salvam o mundo e tudo recomeça depois de uma nova versão do Dilúvio, com arcas e escolhas de espécies para o recomeço. Grande Nação aquela! Quando vejo filmes destes sempre me recordo do filme de animação de Spielberg, "Fievel, um conto americano", em que o mito é tão grande que até os ratos dos navios dos emigrantes (também eles emigrantes, claro) estão convencidos da perfeição do novo mundo, onde...não há gatos! Grande indústria cinematográfica e grande ego coletico, de facto.
Tem a sua graça, nos intervalos do filme, ver os anúncios de Natal.
E agora à noite, já que era para continuar no sossego anticontexto atual nacional, descobri também gravado o Concerto de Ano Novo, da Áustria, claro, comentado pelo Eládio Clímaco, claro.
E que graça terá ele, daqui a pouco, terminar o programa desejando-me Feliz Ano Novo. No dia 4 de Março de 2012!
Fintas que se podem fazer agora ao tempo.
Mas amanhã não há safa: é 2ª feira, de Março, a começar a contagem decrescente para o final do 2º período, com os seus correspondentes testes, classificações e burocracias inerentes ao processo.
E saio eu diretamente do Danúbio Azul...Até me pode fazer mal!   

quinta-feira, 1 de março de 2012

Há tempos

e tempos.
E há que tempos que eu não vinha aqui!
O que merece um texto próprio; ou apropriado. Não meu, mas de quem sobre o tempo escreve.

"Há diferentes formas de entender o tempo enquanto realidade. Nas culturas orientais vêem-no como uma circularidade, uma ciclicidade. Por este lado do mundo pensa-se o tempo como sendo algo linear, recto.
Sabemos que o tempo nos antecede e compreendemos relativamente bem que não acaba quando nóes deixarmos esta vida. Mas a morte aparece como uma certeza de grau diferente, que interpela o íntimo e obriga a viver de forma completamente distinta, como se se tratasse da regra mais importante do jogo.
Ao contrário da nossa existência antes do nascimento, que para ninguém parece ter o mínimo interesse, o que se passará connosco depois da morte já deixa quase o mundo inteiro preocupado."
José Luis Nunes Martins, Nos tempos da morte, Jornal I Fim de Semana, 25 e 26 de Fevereiro de 2012

E a forma de encararmos o tempo depois do tempo de vida talvez seja a característica que mais nos distingue uns dos outros, em termos de cultura coletiva e de comportamentos individuais. Viver em função de continuar a vida depois da morte, ou viver acreditando nas razões biológicas de que só há uma vida?
Será que só se vive uma vez?
Será que se acredita na mesma coisa sobre este assunto durante a vida toda ou, à medida que o tempo avança, a nossa percepção do tempo e do seu carácter único pode modificar-se?

Alguém poderia argumentar: "São coisas que só o tempo pode responder." Mas será que o tempo dá respostas? Ou só cria mais perguntas?
O tempo o dirá! Dirá?