Cumprimentaram-se formalmente.
Tinha ficado um clima muito estranho entre eles desde que tinham tido um breve romance.
Terminara de forma tão abrupta como começara.
Ela sentia-se ameaçada. Quase sempre depois dos momentos de ternura invocava que estava a perder o controlo de si mesma, que a relação lhe tirava a tranquilidade, que ele a criticava ainda que mentalmente...
Ele insistia em pedir-lhe pequenos favores que enfatizavam as questões de género: se podia arranjar qualquer coisa para jantar, se podia passar uma camisa a ferro, porque não vestia um vestido quando iam jantar fora...
Tudo era motivo para discussões. Não eram grandes discussões...eram rabugices que foram minando o prazer de estarem juntos, que faziam antecipar uma crítica ao toque de campainha anunciava o encontro.
Mas havia uma atração...era inegável. Qualquer coisa de físico, instintivo, incontrolável, definitivamente irracional.
Esse era sempre o argumento dele. E a razão das recaídas, várias.
Entraram juntos no elevador.
Ela aspirou discretamente o perfume dele. «Era sempre tão bem apresentado». Tentou considerá-lo vaidoso e fútil, mas a verdade é que a figura dele lhe agradava. Muito. Muito mais do que ela considerava razoável.
Os olhos de ambos encontravam-se furtivamente a tentar olhar para o outro lado.
Quase se ouvia a força que faziam para não caírem nos braços um do outro, ali mesmo.
A situação estava a tornar-se insuportável. E o pior, achava ela, é que ele estava a gostar do sacrifício dela. Mesmo sem falarem, estava a sentir-se irritada com ele.
Ela não queria olhar para ele. Sabia que se trairia. E não queria!
Ele, começou a assobiar baixinho "A Lágrima" da Amália.
O elevador chegara ao fim da sua jornada.
Despediram-se com um vago aceno.
Quando ela entrou no carro as lágrimas já lhe tinham destruído a maquilhagem.
Tenho por meu desespero
Dentro de mim o castigoEu digo que não te quero
E de noite sonho contigo"