segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Pedacinho Airoso

"As igrejas que, paradas, circulam pela cidade inteira, surgem discretas e entaladas entre cabeleireiros e minimercados."

extraído de Lisboa Revisitada de Ricardo Santos, um dos concorrentes de 15/25 publicado na Revista Ler de Janeiro.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Rio de Janeiro

De há uns anos para cá, o mês de Janeiro, devolve-me por uns tempos os amigos brasileiros que, estando em férias por lá, aportam a Lisboa para um conjunto de atividades já habituais.
Em Janeiro acorro eu a Lisboa para os ver, por vezes para participar nas mesmas iniciativas que eles, para me sentar numa plateia ou, simplesmente, para os encontrar e conversar e matar saudades.
Quase sempre um dos encontros é numa esplanada sobre o Rio Tejo; que, nesses dias, se torna, para mim, no Rio de Janeiro. 

sábado, 28 de janeiro de 2012

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Mãos Dadas

"Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos,
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.


Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente."
 
Carlos Drummond de Andrade

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Máscaras

Seria de pensar que eu ia escrever algo sobre o Carnaval. Já vai sendo tempo e até tenho umas coisas para dizer sobre o assunto, mas não. Este post é sobre outras máscaras que entraram na minha vida esta semana por via de uma quantidade de 'ites' alérgicas que se abateram sobre mim; todas ao mesmo tempo.
Agora tenho uma máquina que tem uma máscara e, quando a ponho a funcionar, a casa fica a cheirar a hospital. Mas parece que me vai devolvar a capacidade de respirar livremente e de ter energia.
Não deixa de ser notável inventariar tudo o que inventaram para nos melhorar a vida: e com carácter de portabilidade, que a máquina traz uma 'valise' para eu a transportar se precisar de me deslocar.
Sem dúvida que é uma das coisas que me dá mais gozo "mostrar" no ensino da História é como se tem trabalhado para melhorar a vida das pessoas e como "pequenos problemas" (que hoje assim o são) dantes eram questões incapacitantes.
Ponho-me com estas coisas e já em duas turmas diferentes me perguntaram: acha que um dia seremos imortais? Sei lá...

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Um Recorte da Realidade

Torre do Mosteiro de S. Gonçalo
Amarante - Portugal

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Catando os cacos do caos

"Catar os cacos do caos
como quem cata no deserto
o cacto
..............- como se fosse flor.


Catar os restos e ossos
da utopia
..............como de porta em porta
o lixeiro apanha
detritos da festa fria
e pobre no crepúsculo
se aquece na fogueira erguida
com os destroços do dia.


Catar a verdade contida
em cada concha da mão,
como o mendigo cata as pulgas
no pêlo
.............- do dia cão.


Recortar o sentido
como o alfaiate-artista,
costurá-lo pelo avesso
com a inconsútil emenda
à vista.


Como o arqueólogo
reunir os fragmentos,
como se ao vento
se pudessem pedir as flores
despetaladas no tempo.

Catar os cacos de Dionísio
e Baco, no mosaico antigo
e no copo seco erguido
beber o vinho
ou sangue vertido.

Catar os cacos de Orfeu partido
pela paixão das bacantes
e com Prometeu refazer
o fígado
.............- como era antes.


Catar palavras cortantes
no rio do escuro instante
e descobrir nessas pedras
o brilho do diamante.


É um quebra-cabeça? ..........Então
de cabeça quebrada vamos
sobre a parede do nada
deixar gravada a emoção
.....Cacos de mim
.....Cacos do não
.....Cacos do sim
.....Cacos do antes
.....Cacos do fim.


Não é dentro
......nem fora

embora seja dentro e fora
.....no nunca e a toda hora
que violento
....o sentido nos deflora.


Catar os cacos
do presente e outrora
e enfrentar a noite
com o vitral da aurora."

Affonso Romano de Sant'Anna

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Um Bom Ano Novo

"Sabia que não podia prolongar por mais tempo aquele momento. Não seria socialmente razoável.
Por isso, com muita pena, desprendeu do prego o gordo e fôfo boneco de neve que durante mais de quinze dias lhe dera as boas vindas a casa. Desceu-o e arrumou-o numa caixa colorida que guardou vagarosamente no sotão, juntamente com a sua esperança nas mudanças de «um Bom Ano Novo».
Lá em baixo a porta bateu com estrondo. O arrastar dos pés e os passos irregulares deixavam adivinhar uma figura cambaleante...mais uma vez...
Num acto irreflectido abriu de novo a caixa e introduziu a mão até sentir o toque quente da fazenda branca onde estavam desenhadas as bochechas rosadas do boneco de neve. Ficou assim um bocadinho, com os olhos fechados com força:como se aquele contacto fosse o de uma mão amiga, consoladora, uma companhia. Depois, o inevitável grito rouco do pai chamou o seu nome e nada mais havia a fazer do que abrir os olhos e descer a escada, rumo a todos os dias todos iguais que se seguiriam, por mais um-ano-inteiro, afinal tão velho e gasto como o anterior."

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Trova da Saudade

"A saudade causa dano,
nas imagens da memória.
Um detalhe vira engano,
passe um dia ou passe um ano,
e aí já vira história...
Tuas imagens, de tão belas,
luto para não perdê-las.
E pra não ficar sem elas
vou além destas janelas:
toda noite colho estrelas!"

Cesar Veneziani

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

O passado passou-se mesmo assim?

"E ainda há quem pense que o passado é um assunto arrumado ou matéria para as falíveis artimanhas da recordação." Começa assim a coluna Par ou Ímpar, de Luis Ricardo Duarte, no JL, em que aborda o resultado de investigações recentes que contrariam a ideia comummente aceite de que Van Gogh se teria suicidado, para levantar agora a hipótese de ter sido assassinado, ainda que por acaso.
Interessam-me as suas palavras pela forma como equaciona as nossas ideias sobre o passado. No início e no fim do texto. Que remata assim: "Talvez nos permita reforçar a ideia de que o passado é assunto sério. Levanta mais problemas do que soluções. Ou não estivesse todo por arrumar."

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

O tempo

Terei que aceitar que já não sou jovem.
É uma constatação; das mais jovens deste ano.
E não sei se tenho muita pena...

Hoje dediquei o dia às compras; por várias razões: a senhora vinha cá limpar a casa e duas mulheres numa casa são demais; a escola recomeça amanhã e não me apetece pensar nisso; ainda me faltavam comprar prendas de Natal para pessoas que só verei já neste ano; resolvi espreitar os saldos, pode ser que haja boas oportunidades.
Dirigi-me então a uma cidade perto, que tem um centro comercial maior que o de cá e também comércio tradicional.
Na loja dos pijamas lá enfeirei qualquer coisa, deliciada com as novas possibilidades de construirmos nós os conjuntos, pois as peças são separadas e eu tenho sempre a sensação de que só eu farei aquela combinação de peças. (Também há poucas probabilidades de comprovar a minha teoria, pois não tenho sido muito convidada para festas de pijama).
A funcionária (uma jovem) estava à beira de um ataque de nervos: o sistema não funcionava! Chamou a supervisora - que se pôs de imediato ao telefone "para a informática" - e avisou-me "Vou ter de lhe fazer um talão manual".
"Com certeza", respondi-lhe.
"Não tens de dizer nada", disse-lhe a supervisora.
"Mas a senhora vai ter de esperar mais..."
"Eu não me importo", tentei acalmá-la, "Eu ainda sou do tempo em que o tempo das compras incluía o tempo de escrever a factura ou recibo"
Olharam as duas para mim com pena e sobressalto. Acho que recearam que eu fosse fazer um discurso sobre "o meu tempo".
"Eu estou tão stressada", rematou a moça.
"E a informática que não me responde", murmurou no mesmo tom stressado a outra, como se tentasse adivinhar porque é que a D. Informática não largava a revista de crochet e não corria para o telefone.
Apeteceu-me dizer qualquer coisa como "Quem sabe se a D. Informática não se estará a sentir mal...", mas recolhi a minha vontade de brincar porque as pessoas stressadas podem ficar muito agressivas.
Resolvi ir almoçar ao MacDonald's, depois de ter constatado que a minha pizzaria preferida da cidade é uma das recentes vítimas das faências das "piquenas e médias empresas". Caos total! Completamente cheio de jovens com filhos (duas gerações de apreciadores de McDonald's já se juntam por lá) e de reformados modernaços.
Os pais não têm paciência para os filhos! Mais uma vez percebo que o prolongamento do tempo de escola visa servir as famílias, não só porque não têm tempo para estar em casa com os filhos, mas, sobretudo porque não sabem estar com os filhos.
A rapariga à minha frente (devia ter uns vinte e três, vinte cinco anos) envergava calções de fazenda sobre collants opacas e umas botas curtas com pelo; tinha olhos azuis e uma pele muito fresca. Estava nitidamente com os amigos - mais três criaturas jovens e descontraídas, na casa dos 20 - e tinha trazido os dois filhos. Berrava com eles com desespero e desorientação, porque as crianças não ficavam sossegadas a guardar a mesa...A certa altura disse para os amigos "De facto, é melhor nunca os tirar de casa. Eles não sabem estar fora de casa e ao menos lá não envergonham ninguém."
Mais uma vez guardei a minha vontade de intervir.
Atrás de mim quatro jovens em idade de serem estudantes discorriam sobre o tempo que se gastava nas filas: "Oh men! Será que aqui ainda não conhecem aquelas máquinas? Escolhes o que queres comer e pronto. Atendimento com pessoas é que dá..."
Estão a ver o que aconteceu? Pois. Guardei mais uma vez a minha vontade de intervir. De lhes perguntar se gostariam que uma máquina lhes roubasse o emprego, que lhes daria dinheiro para poderem comprar comida nas máquinas.
Abriu outra caixa e a turba dirigiu-se alarvemente para lá. Ninguém se ralou com quem estava na fila, a ordem de chegada...coisas de pessoas, 'tão a ver?
Aguardei calmamente a minha vez de ser atendida por pessoas, pedi o menu e observei que todos os que tinham pressa ainda lá ficaram a chupar os dedos de molhos brancos e vermelhos. Para que queriam o tempo então? Para que é que andam a correr? Para chegar a velhos mais depressa e depois perceberem que as máquinas não lhes fazem companhia? Ou se calhar estes já são da geração que, de tão ligados à máquina, não reparam que o tempo passou.
Recolho a casa um bocadinho triste.
Preparo-me para organizar as coisas para amanhã e, na lista das prioridades, estão primeiro os impressos que tenho de fazer assinar pelos pais, a entrega de uns impressos na Direção, a marcação de uma série de coisas...e só no fim as aulas das crianças.
Tenho tantas saudades do tempo em que o mais importante era perguntar-lhes como tinham corrido as férias e falar-lhes dos livros que tinha lido nos dias em que tínhamos estado separados.
Eu sou a mesma, os programas também. O que mudou? Os tempos? Ou o nosso uso do tempo...
Tenho saudades de outro tempo!

domingo, 1 de janeiro de 2012

Toada à toa

"A vida, apenas se sonha
que é plena, bela ou o que for.
Por mais que nela se ponha
é o mesmo que nada por.


Pois é certo que o vivido
- na alegria ou desespero -
como o gás é consumido...
Recomeçamos de zero."

Ferreira Gullar