segunda-feira, 28 de outubro de 2019

A Meias

"Meias, só para as pernas", dizem-me que era uma frase recorrente do meu pai.

sábado, 19 de outubro de 2019

Responsabilidade Social

"O adolescente pode ser teimoso, irreflectido e inconsciente. Pode ter emoções exageradas e reacções súbitas e dramáticas mas o que ele procura nos pais, nos professores e na sociedade é o modelo e não o discurso.
Essa é a nossa responsabilidade. Eles serão os adultos que viram em nós."

Machado, Maria do Céu, Adolescentes, pp.103-104

quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Como um cartoon

O enorme, robusto e vetusto prédio da frente está a ser pintado. Fica a uma distância grande (não deixa de ser o prédio da frente) porque temos um jardim e dois braços de rio de permeio. Assim sendo, permite-me uma visão bem distanciada da obra. Suficientemente perto para ver e ouvir os operários autores da obra, suficientemente longe para ter a visão de conjunto.
Está a se pintado de um amarelo forte muito agradável. Reflicto que por estes dias muitos prédios desta cidadezinha estão a ser aveludados de amarelo forte ou grená, o que enche as páginas urbanas de um colorido outonal muito agradável. E creio que no Verão, banhadas pelo sol, também serão muito confortáveis de frequentar.
Bem, este distanciamento vizinho permite-me então ver a obra avançando. Montagem de andaimes do lado direito, protecção das janelas, limpeza, pintura. Desmontagem dos andaimes e repetição do mesmo processo, lâmina a lâmina para o lado esquerdo do edifício.
Estão na segunda metade agora. Diminuiu o número de operários. Hoje de manhã só lá andava um.
De dentro do prédio uma senhora abriu a janela e, percorrendo a varanda, começou a inspeccionar o espaço que já está livre de andaimes. Tinha uma pistola de limpeza na mão e envergava um avental.
Um pouco mais acima o único operário do dia retirava as fitas de protecção das janelas e, terminada cada janela, escorregava por entre os andaimes para outra janela, por vezes de outro piso, como se fosse invertebrado, ou um boneco daqueles jogos labirínticos.
Toda a cena vista de longe parecia um cartoon. Imaginei-os com pequenos balões a sair das bocas.
A senhora recuou, o operário desceu...Durante uns minutos esperei que eles chocassem, conversassem, que os balões se enchessem de símbolos que significam imprecações.
Na...a senhora deu a volta sempre a fitar atentamente o corrimão da varanda; o homem desceu duas janelas e, provavelmente nem deu por ela.
Amanhã ou depois retirarão os andaimes e o prédio volta a ser um prédio e eu perco o privilégio de criar diálogos com as personagens pequeninas que povoaram, por semanas, a vista da minha janela indiscreta. 

terça-feira, 15 de outubro de 2019

Procura-se um tapete voador

Voltei ao mundo do maravilhoso e do fantástico.
Livre que estou este ano da obrigação de racionalizar tudo, comecei a ter saudades do meu tapete voador.
Não me tinha dado conta (a infância já vai ficando tão atrás) que adorava as histórias que envolviam um tapete voador.
Recordei-me disso aqui há uns anos, no momento de relaxamento de uma aula de yoga, em que o professor nos convida a imaginar-nos num lugar de sonho, de conforto, numa situação muito aprazível...e eu dou comigo num tapete voador. Não me apercebi logo do que se passava. Primeiro vi ao longe umas torres invulgares - do Kremlin ou dos Palácios do Mundo de Aladino - e, à medida que se aproximavam, apercebi-me que as via de cima, que as sobrevoava. E depois lá me vi sobre o tapete, com uns olhos grandes de conhecer - escuros, como nos bonecos da Heidi - e uma melena preta a ondular com o vento.
Fiquei surpreendida. Saí daquela aula muito menina.
Mas arrumei de novo o tapete na área das memórias/fantasias e a calquei tudo com a brutal dose de realidade racional-o-capitalista de que me tenho servido em doses industriais.
Até chegar ao momento presente.
Se é para aproveitar para viver sem espartilhos, é o momento de voltar a usar o tapete.
Comprei uma edição dos Contos das Mil e Uma Noites, que, na realidade, nunca tinha lido (pelo tamanho da edição nem a 500,5 devem chegar os contos) e deixei-me embalar nas histórias fantásticas que não carecem de lógica, que me transportam ao mundo da minha infância, dos olhos grandes de aprender, da boca aberta de sorver emoções, sem explicação, sem necessidade, sem quê nem porquê. Só assim. Porque sim. Tão assim.
Ainda não cheguei a nenhum tapete (mas já encontrei dois génios, não em lâmpadas, mas em panelas) e muita, muita magia. Em contos que se desdobram como matraioskas (a expressão não é minha, é do prefácio da obra, mas é tão ela) passeio por maldições e encantamentos, feitiços e transmutações e tudo, tudo é possível. Tão facilmente possível.
É um deleite! Expressão que irrompeu da minha leitura, assim, sem mais aquelas. Uma palavra arrumada há quase tanto tempo como o tapete.
Talvez porque desejo e procuro o tapete, o dia hoje foi dado a céus. Deslumbrantes, espantosos, maravilhosos e fantásticos. Para viver à força toda, sem necessidade, quê nem porquê.
Tão bom!


segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Preparando improvisos

Hoje concluí que tenho uma boa capacidade de improvisação, sobretudo quando sei exactamente o que vou fazer e dizer.

quarta-feira, 9 de outubro de 2019

Do romance da própria vida

"(...) poderíamos deduzir que os humanos são, acima de tudo, romancistas, autores de um único romance cuja escrita demora toda a sua existência e na qual reservam para si o papel de protagonistas. É uma escrita, isso sim, sem texto físico, mas qualquer narrador profissional sabe que se escreve, sobretudo, dentro da cabeça. (...)" (p.8)

Montero, Rosa, A Louca da Casa, Porto, Livros do Brasil/Porto Editora, 2017