domingo, 31 de agosto de 2014

A minha varanda nova

É o primeiro Verão que tenho estas varandas.
Na varanda da frente - que na realidade é nas traseiras do prédio - há sempre um espectáculo diferente em cada fim de tarde.
Por vezes é o casal de garças que se reúne ao lusco-fusco, hoje era um grupo de 7 patinhos que avançavam cautelosamente pelo rio, tasquinhando alegremente iguarias patais que devem encontrar-se fresquinhas no rio, agora limpo.
A gata vadia. que pela sua liberdade faz inveja às minhas bichanas, regressou agora ao condomínio.
O breve murmurar da água enche a atmosfera que hoje esteve cheia dos risos de um grupo de jovens de uma equipa desportiva que aqui se fez fotografar.
Amanhã tudo ganha a gravidade do primeiro dia da semana e do ano escolar.
Eu saio cedo para mais um exame de equivalência à frequência, a biblioteca abrirá às dez, com as suas janelas voltadas para o jardim e o rio, outrora força motriz da indústria que construiu os edifícios hoje dedicados à cultura.
Coço a picada de uma melga, esfrego os olhos para divisar as letras do teclado num lusco que já quase é só fusco.
Vou parar de escrever. Sorver a noite de verão na minha varanda nova, ouvir o rio a correr em férias pela última vez neste ano escolar que termina hoje, porque amanhã é já outro.
E a minha varanda acalma-me, garante-me que vai cá estar em cada fim de tarde, de regresso ao barulho do rio, ao lusco-fusco surpreendente de toda uma fauna calma, acolhendo-me no remanso do meu espaço novo.

Recomendável

Muito bom, muito bom!

Talvez devêssemos hoje em dia rever a coragem, a estratégia e a inteligência de outros tempos.
Se calhar é difícil encontrar hoje os documentos porque escreviam pouco, mas, como se vê, faziam muito.

Talvez não fosse má ideia estudar História, incentivar o estudo da História, inspirarmo-nos na História.

Aqui fica um excelente documentário!

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

"Ela sabia que aquilo ia acontecer, mais cedo ou mais tarde.
Aquelas visitas regulares, insípidas, mas persistentes. Aquele enrolar das mãos por não saber o que dizer, aquele «estou aqui porque quero estar contigo»...
Parecia um namoro à moda antiga.
Ela questionava-se todos os dias porque o deixava entrar, estar, ter esperança.
Depois concluiu que talvez valesse a pena tentar. Afinal se todos os outros acasalavam ou pareciam loucos para o fazer, ter alguém devia ser encantador.
Mas é que não era.
«Não será a pessoas certa» questionava-se. «Mas isso existirá?». «Afinal de contas sempre pus defeitos em toda a gente, nunca vi vantagem em estar acompanhada...devo estar errada...com certeza não serão os outros todos a estar errados...»
«E ele é tão bom rapaz»; «E seria moço para te fazer feliz», «Se não lhe deres uma oportunidade nunca acontecerá»; E todos os outros argumentos que tinham o seu quê de verdade.
Ele perguntou um dia se poderia aparecer à noite e ela lá lhe disse que sim.
Abdicou de estar em calções ou em pijama e muito menos descalça, que o moço deveria vê-la composta...Com posta, cabeça e rabo, sentia-se ela ali, pescada na sua própria casa, sem estar à-vontade.
E chato....que ele era, coitado!
Foi quando começou a acrescentar o epíteto «coitado» aos seus pensamentos sobre ele que começou a ter dúvidas. Ou melhor, certezas. Dúvidas ela sempre tinha tido e foi do aproveitamento dessas dúvidas que nasceu a possibilidade daquele incómodo diário.
Naquele dia ele torceu mais as mãos que o costume e ela esfregou as suas (mentalmente) de contente. Ele ia decidir-se e aquilo ia poder ter um fim.
Ele lá murmurou a declaração, ou proposição, que ela nem soube bem o que aquilo era: era o pretexto para poderem ter uma conversa definitiva, foi assim que ela o recebeu.
- E o que é que tu tens para me oferecer? - ouviu-se dizer, regateira da praça, economista dos sentimentos e das relações.
- Eu. O que eu tenho para te oferecer é o que tu vês - ele, de olhos baixos, já desconfiado daquela reacção que não vinha nos romances
- E porque é que tu achas que vales a pena? - investiu ela, cruel
Ele não conseguiu responder. Talvez tenha pensado que não valia a pena (isso, ela só pensou dias depois). Virou as costas e desceu a rua sem olhar para trás, os ombros descaídos em sinal de derrota.
Ela fechou a porta triunfante quando ele chegou ao fim da rua. Descalçou-se. Sentiu o frio do mármore nas plantas dos pés. Tinha recuperado a sua liberdade!
Era impossível que os outros não vissem que era muito melhor estar sozinha.
Afinal o que é que os outros viam nos outros?
Decidiu que não valia a pena pensar nisso e que nessa noite ia dormir nua, esplêndida, sozinha...ou consigo mesma?"
"amo-te tanto mas hoje tenho de levar o carro ao mecânico, as rodas fazem um barulho estranho, não deve ser nada mas é melhor prevenir, amanhã prometo que vamos ver que tal se come naquele restaurante novo junto à rotunda, e depois levo-te ao cinema, ai não que não levo,
amo-te tanto mas hoje tenho de ver o treino do miúdo, o treinador ligou e disse-me que temos craque, o nosso menino a jogar como gente grande, vê lá tu, quando chegar com ele vê se tens prontinha aquela comida que ele adora, o puto merece, ai não que não merece,
amo-te tanto mas hoje tenho de ficar até tarde no escritório, há aquele projecto do estrangeiro para fechar, está aqui tudo perdido de nervos, não sei se aguento, daqui a pouco ligo-te para saber como vai tudo, o miúdo e as coisas aí em casa, agora tenho de ir mostrar a esta gente toda como se trabalha, ai não que não tenho,
amo-te tanto mas hoje tenho de me deitar cedo, amanhã é aquela reunião importante de que te falei, se conseguir o cliente vamos ser tão felizes, aquela casa, o carro novo, quem sabe?, só tenho de o conseguir convencer, tenho tudo prontinho na minha cabeça e nada pode falhar, vamos ser ricos, é o que é, ai não que não vamos,
amo-te tanto mas hoje não estás, cheguei à hora combinada para te levar a jantar e tu não estás, o miúdo também não, deve estar no treino, deixa-me cá ligar, ninguém atende, nem tu nem ele, provavelmente deves estar a preparar alguma, sempre foste tão assim, cheia de surpresas, daqui a nada entras pela porta e dizes que me amas, ai não que não dizes,
amo-te tanto mas hoje tenho de assinar este papel, olho-te e peço-te perdão, prometo-te que não vai haver mais mecânicos nem treinos nem clientes estrangeiros nem reuniões entre nós, garanto-te que te quero acima de tudo, olho-te mais uma vez nos olhos e procuro acalmar o que te dói, mas tu só dizes para eu assinar e eu assino, as mãos tremem e até já uma lágrima caiu sobre elas, o nosso filho quando souber vai chorar como um menino pequeno outra vez, o nosso craque, podias ficar pelo menos pelo nosso craque, ou pelo menos por mim, para me manteres vivo, Deus me salve de não te ter comigo, sou uma impossibilidade se não te tiver para gostar, ai não que não sou,
amo-te tanto mas hoje não tenho nada para fazer, a casa escura, um silêncio vazio e nada para fazer, apenas esperar que te esqueças de mim e me voltes a amar, e eu amo-te tanto, ai não que não amo."

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in "Prometo Falhar", a mais recente obra de Pedro Chagas Freitas.
"Não me roube a solidão sem antes me oferecer verdadeira companhia"
Frase atribuída, no Facebook, a Nietzshe.

A Coleccionadora

"Nunca tinha sido grande coleccionadora.
Herdara uma colecção de carteirinhas de fósforos do pai e uma colecção, muito incompleta, de selos da mãe. Pouco lhes acrescentara. Às vezes abria os álbuns e as caixas e olhava as espécies. Intrigava-a ter todas aquelas coisas ali, quietas, sem ser para usar...Mas, o que iria fazer com aquilo? Os quadros que herdara da tia Margarida passaram a decorar a sala da lareira, a roupa que tinha - alguma também herdada - usava-a, exibi-a, gozava-se dela, mas as colecções...não serviam para nada, era até uma pena ter aquilo tudo ali preso.
Naquele dia ele telefonou mais uma vez. Era um daqueles telefonemas que ela andava a evitar há algum tempo. Tinha até enviado uma mensagem a pedir que não lhe ligasse mais, que não lhe apetecia falar com ele. Mesmo assim ele ligara mais três ou quatro vezes que ela não atendeu e depois ligou de um telefone fixo, num dia já disperso, em que ela pensava tê-lo dissuadido.
Atendeu por pensar que poderia ser de alguma firma, de alguma coisa importante.
A voz dele era alegre, jovial, com um tom de triunfo: «Sabes que eu nunca desisto. Não vejo razões para não falares comigo. Não te fiz mal nenhum.»
Conversaram durante um bocado. Ela sabia que não adiantava recusar: assim a conversa transformar-se-ia em discussão e duraria o mesmo tempo. (Recordava tempos em que lhe desligou o telefone e as mensagens sucederam-se acusatórias, desagradáveis, até ela decidir atender outra vez).
Desta vez, enquanto conversava com ele, não se conseguiu concentrar.
Ele nem disfarçava que estava numa outra relação, que vivia já com outra mulher, mas insistia em manter aquela ligação, aqueles telefonemas periódicos, aquela verificação de que ela continuava ali, disponível, de certa maneira.
De repente sentiu-se um selo no álbum, uma caixa de fósforos na caixa grande de arrumação.
Ele estava apenas a verificar e contemplar a sua colecção. A sua colecção de pessoas.
Abria o álbum, certificava-se da sua posição, contemplava a sua beleza, eventualmente avaliava o seu valor. E fechava o álbum das coisas que se guardam e não se usam. Das coisas que se têm para, de certa forma, provar o nosso poder, reencontrar o nosso passado, manter um laço qualquer com um pedaço de nós mesmos.
Concluiu isto tudo enquanto respondia mecanicamente ao seu discurso egocêntrico, à torrente de palavras animadas que tinham como denominador comum a pessoa do seu autor: «Eu isto, eu aquilo...», mimava-o enquanto lhe respondia.
Mudou o telefone de lado para ficar com a mão direita livre.
Abriu o álbum, depois a caixa.
Terminou a conversa a pretexto de ter de continuar uma qualquer tarefa.
Depois do clic, riscou cada fósforo, queimando cada um dos selos. Nunca mais ninguém ia desinquietar aquelas espécies, para não as usar, para lhes provar a propriedade. 
Mortas, destruídas, em cinzas, as suas colecções eram enfim livres."

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Intelectual? K'é ixo?

"Eu cresci num tempo em que o intelectual tinha um determinado peso na sociedade, ou seja, os intelectuais tinham uma voz, exercitavam a sua voz e a sua voz era escutada, mesmo que para divergir...Eu não tenho a certeza que hoje em dia isso ainda aconteça. Pelo contrário, acho que hoje em dia se esbateu muito isso, porque a figura do intelectual foi substituída pelo famoso televisivo (...)."
Mega Ferreira em entrevista ao Programa Nas Nuvens, Canal Q, transmitida em reposição, hoje, agora.

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Rimei

Em casa da minha avó paterna - muito menos palavrosa que a minha mãe - imperavam as rimas. A minha avó não lia muito, mas (talvez para fixar as coisas, não sei) arranjava sempre uma rima perfeita para uma afirmação.
Lembro-me tão bem: "O sr. Magalhães (ao que a avó acrescentava) esfola gatos, mata cães"; "Senta-te perna, cá anda quem te governa" (impreterivelmente após arrumar a cozinha, quando se sentava no sofá), "Ai, ai, grande casa tem meu pai" (para justificar um suspiro) ou, os menos ortodoxos, "Vergonha é não ter um homem em quem se ponha" ou "Quem dá é tio, quem não dá puta que o pariu".
Enfim, ao longo do tempo, adaptado a cada situação quotidiana, havia uma rima para tudo.
Foi também uma forma de me ter habituado a amar as palavras: as palavras que rimam, as palavras que condizem, as palavras que preenchiam o vazio de uma frase sem interlocutor.
Por isso hoje teve muita piada quando eu pensava assim:
"Amanhã volto ao serviço" e, acto contínuo, ecoou no meu espírito uma "deixa" do Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente, (que quase todos os anos vejo representada quando acompanho os alunos de 9º ano): "Parece-me isso cortiço".
Não sei se a minha avó se ria sozinha das suas rimas, mas eu soltei uma gargalhada com gosto e repeti, desta vez em voz alta: "Amanhã volto ao serviço, parece-me isso cortiço"
E parece. Mas lá vou eu!

domingo, 24 de agosto de 2014

Eu sou óptima

a deixar para amanhã o que poderia ter feito hoje.

sábado, 23 de agosto de 2014

Nostalgia

Hoje, acerca de um trabalho de grande fôlego que venho desenvolvendo com uma colega, surgiram-me de rompante memórias do meu tempo de Faculdade. Das tardes e noites nos corredores da Faculdade de Letras, a tentar compor textos conjuntos. Dos meus repentes de escrita, sobre um molho de folhas de rascunho, as outras caladas esperando pela escrita que não conseguia ser dita. "Deixem-me escrever! Só sai por escrito." Depois a leitura, a mudança de uma ou outra palavra.
Adoro escrever!
Adoro verter num texto o resultado de uma investigação, de uma inquirição às fontes; adoro compor um puzzle em que se vão reconstituindo ramos do passado, sentindo que estou a contribuir para a árvore do conhecimento da História.
Recordei a minha colega de trabalho de muitos anos. Tínhamos uma dinâmica de trabalho incrível. Parece que já estávamos sintonizadas...Por vezes ficávamos a olhar para um espaço em branco no papel, a palavra certa não saía...
Eu, mais desesperada e colérica, arremetia impropérios, ela, mais ponderada e segura, começava a alinhar palavras até descortinarmos a palavra perfeita.
E que alegria, Meu Deus!\ A palavra perfeita...Hoje tenho a sensação que achávamos que os nossos trabalhos de Faculdade eram obras primas...
Eram suadinhas e honestas, que nós trabalhávamos de alma e coração e queríamos muito produzir coisas a sério.
Às vezes penso em como foi por essa época que descobri a investigação.
Eu gostei tanto do meu curso! Adorei andar na Faculdade!
Hoje desceu uma nostalgia...só me apetece chorar, de saudades, de ser nova, de querer descobrir e escrever o passado, de acreditar que existe sempre uma palavra perfeita para cada espaço em branco.

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Pequenino!

Bem...com esta cena do Facebook vou mesmo convencer-me que o mundo é pequeno.
Então não é que quando me lembro de procurar um locutor de rádio, um ator ou um escritor que me agradam temos sempre algum amigo em comum? Caramba! Sinto-me famosa. Não me sabia de tão amplas relações.

With a little help from my friends

Hoje é dia de S. Bernardo, que faleceu nesta data em 1153, após ter dado a sua última autorização para a construção de mais uma Abadia Cisterciense: o Mosteiro de Alcobaça.
A aceitação desta doação de Afonso Henriques terá sido um impulso significativo para o reconhecimento de Portugal como reino independente, ou seja, provavelmente, a primeira "cunha" da História de Portugal.
Bernardo de Claraval foi um Doutor da Igreja.
Faz hoje 4 anos que entreguei na Universidade- à sombra tutelar de S. Bernardo, assim o creio - os vários exemplares exigidos da minha tese de doutoramento. O peso do conhecimento era tão grande e palpável que tive de ter a ajuda de amigos que, arrastando literalmente o fruto dos meus estudos em veículos rodados com ar de aeroporto, me ajudaram a terminar esta grande empreitada da minha vida.
Hoje é o Dia de S. Bernardo, da cidade de Alcobaça e também da celebração do términus de um trabalho que afinal, mesmo que eu disso não tivesse consciência, estava nos meus planos há muito, muito tempo.
Hoje é um dia muito significativo para mim e, como não podia deixar de ser, de celebração dos meus amigos, sem os quais não teria conseguido escrever o trabalho e levá-lo até ao local de entrega.

terça-feira, 19 de agosto de 2014

Mística

Depois da busca por caçadas e pelejas, busco a paz...interior.
Museu Oriental, Valladolid

sábado, 16 de agosto de 2014

Dicotomia

Cangas de Onis - A ponte com a cruz das Astúrias


Do Céu e da Terra; da Paz e da Guerra; fiéis e infiéis; do claro e do escuro; do dia da noite; do crer e e descrer; Começar, Acabar; Finito, Infinito; Impossível, Possível.
A imagem, a emoção, a reflexão. O momento, o tempo todo. 
Estar aqui!   

O Regresso

Oviedo, Astúrias, Espanha

No regresso

Não sei quando é que comecei a gostar de viagens, mas foi certamente muito antes de as experimentar. Recordo os livros "Céu Aberto" e "Em Pleno Azul" que contavam as histórias de uma família em viagens. Havia um tio (solteiro e intelectual), o tio Jeremias, que ia explicando, por vezes de maneiras pouco ortodoxas, os lugares, as cidades, os monumentos, aos jovens da família. Foi lá que aprendi que a Itália é uma bota que está a dar um pontapé à Sicília. Depois lembro-me de uma série de televisão que se chamava "Dois Anos de Férias" e consistia no relato das aventuras de um grupo de jovens num navio que fica desgovernado ou qualquer coisa assim, que agora me aprece um pouco inverosímil, mas que me prendia ao écran. Para não falar de Marco Pólo, que durante muito tempo julguei ser uma personagem de ficção ou de Sandokhan. E havia, antes de tudo isso, o Vickie, a Heidi e o Marco, que falavam de paisagens distantes. E a Música no Coração, que começa e termina em paisagens soberbas.
Depois há a compreensão de que as viagens físicas, que implicam uma deslocação, são também (ou sobretudo?) viagens interiores, aberturas de espírito, momentos de questionamento e, sempre, de aprendizagem.
Comecei a viajar tarde, se não contarmos as viagens nas páginas dos livros e os sonhos de tapete voador.
As viagens sempre me fascinam. Cada viagem é um momento mágico, cheio de emoções, de reflexões, de sentimentos à flor da pele, de querer muito que os momentos sejam perfeitos, porque poderá ser a única vez ali, mas, mesmo que assim não seja, será sempre a primeira vez.
Estar nos locais onde as coisas aconteceram; tentar apreender o espírito dos locais; compreender o passado, a espessura daquele local, uma densidade histórica, emocional, um magnetismo que atrai ali muita gente. O que atrai as pessoas ao local? Qual o papel da História contada na mística dos locais? Que faço eu ali? Porque escolhi aquele local e não outro? Como faço eu parte desse local, como faz esse local parte de mim?
Agora faz. Mas, dantes, já fazia, porque era um desejo meu estar ali...
Venho de uma viagem planeada. Foi uma emoção muito grande poder estar em certos locais, conhecer espaços e histórias e espaços da História que há muito sentia que queria conhecer.
Envolvida na emoção da viagem dou por mim no regresso. E compreendo que o regresso também é uma parte importante da viagem.
O regresso poderia ser o motivo de uma viagem. Só partindo podemos regressar. E só regressando avaliamos as coisas de uma outra forma. As rotinas que nos oprimiam podem ser, de certa maneira, uma segurança no nosso dia a dia; a casa que nos ocupava tempo de mais pode ser uma surpresa acolhedora. Parar para olhar à volta. Parar para recomeçar, com outro ânimo, com outra perspetiva. Parar para poder andar. Partir para poder voltar. Sair para compreender o interior.
Não tinha percebido a importância da fruta e dos iogurtes na minha alimentação, no meu dia a dia. Fizeram-me falta: é porque são importantes. Foram as primeiras compras do dia.
O dia do regresso foi passado a namorar com a casa; a recuperar a energia que me faltava há duas semanas atrás, quando estava farta, quando queria partir (e nem sabia que queria voltar).
Para remate da noite abro o doce de goiaba que trouxe de outras viagens (que arrumara na despensa noutro regresso); não gosto do sabor dele sozinho, falta-lhe qualquer coisa...Lembro-me do costume aprendido nesta viagem, trazido agora mesmo neste regresso: tostadas com mantequilla e marmelada. Que bem ficam as tostas com a manteiga e o doce de goiaba por cima. Bato com os olhos na garrafa do néctar do Douro que estava intocada por falta de tempo para a apreciar condignamente. A mesa está composta.
As gatas estão no sofá, enroscadas, mas ouve-se o seu suave rom-rom, celebração do meu regresso.
Olho a mesa: celebração de viagens, de amizade, de regressos, de ser, ter e haver.
Ergo o copo: A todo o contexto - ao partir, ao voltar, ao crescer, ao ser possível.
Agora, tudo parece possível, quando há bem pouco tempo o cansaço alimentava as dúvidas.
Ergo o copo: aos regressos e aos recomeços! Ao ter para onde regressar e onde recomeçar!
Ao querer partir para querer regressar!  

domingo, 3 de agosto de 2014

Férias

"- Uma terra chamada Álamo?
- É um nome estranho...aqui no Alentejo...
- Um álamo é uma árvore. Não sei bem que árvore é...tenho ideia que é de sombra, alta...Hum: uma alameda deve ser um espaço ladeado de álamos, não vos parece?"

Ninguém pareceu muito entusiasmado com a questão, na viagem pacata, em que tentávamos esquecer a falta de sol numa semana inteirinha de Algarve. Mas eu fui agora verificar e é mesmo: Uma alameda é um espaço ladeado por árvores de sombra, por exemplo, álamos.

"Ala moço, que se faz tarde!", dizia a minha avó.

Há tanto tempo que não tinha tempo para me enredar nas palavras, para me embalar nos sons e para descobrir as similitudes só porque é bom!

sábado, 2 de agosto de 2014

Mais mau que o tempo

Eu sei que não devia; não é cristão, não é bonito, não fica nem parece bem, mas...a única coisa que me agrada neste tempo é que o Passos começou ontem as férias no Algarve.