segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Olha ali: 2013!

Perspetivas, projetos, esperança, horizontes...tudo isto sobre o pano de fundo de saúde e o amparo de amigos.
São os meus desejos para o próximo ano dirigidos a todos os que estimo.

Até para o ano amigos!

sábado, 29 de dezembro de 2012

Amar...o Amor

Venturosa de sonhar-te
Venturosa de sonhar-te,
à minha sombra me deito.
(Teu rosto, por toda parte,
mas, amor, só no meu peito!)

–Barqueiro, que céu tão leve!
Barqueiro, que mar parado!
Barqueiro, que enigma breve,
o sonho de ter amado!

Em barca de nuvem sigo:
e o que vou pagando ao vento
para levar-te comigo
é suspiro e pensamento.

–Barqueiro, que doce instante!
Barqueiro, que instante imenso,
não do amado nem do amante:
mas de amar o amor que penso!


Cecília Meireles (1901-1964)

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Desencanto

Eu faço versos como quem chora
De desalento , de desencanto
Fecha meu livro se por agora
Não tens motivo algum de pranto

Meu verso é sangue , volúpia ardente
Tristeza esparsa , remorso vão
Dói-me nas veias amargo e quente
Cai gota à gota do coração.

E nesses versos de angústia rouca
Assim dos lábios a vida corre
Deixando um acre sabor na boca

Eu faço versos como quem morre.
Qualquer forma de amor vale a pena!!
Qualquer forma de amor vale amar!


Manuel Bandeira  (1886-1968)

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

E se...?

Faz hoje 40 anos que a minha família ficou destroçada.
Faz hoje 40 anos que ruiram os pressupostos sobre os quais se pensavam o presente e o futuro da minha família.

40 anos depois penso...(como digo aos alunos que não vale a pena pensar). E se o meu pai não tivesse morrido nesse dia? E se ele tivesse sobrevivido ao ataque cardíaco? Teriam os meus pais sido «felizes para sempre», até hoje? Teríamos nós crescido com menos lágrimas ou resvalariam outras por motivos que não aconteceram? Teriam os meus pais tido um divórcio, como tantos lares de colegas meus tiveram? Estariam agora velhinhos a embirrar? Seriam um encargo ou uma ajuda para nós?
E nós: teríamos os mesmos percursos que tivemos? Alguma de nós teria seguido com o negócio de família que teve de desfazer-se «por causa da desgraça que nos atingiu»?

Não vale a pena pensar «E se?», mas é quase inevitável fazê-lo, em dia que se assinala uma viragem tão grande que a nossa vida sofreu.

Ou sofre ainda...que a capacidade de guardar e de evocar o que de mau nos marcou excede em muito a capacidade de guardar e evocar (deveria mesmo ser convocar) as alegrias que nos adoçaram a vida.

Outras Crises


Defendo eu, repetidamente, que esta crise não é pior que outras e que o que agiganta a nossa angústia é uma consciência das coisas “em tempo real”, insistentemente aumentada pelos vários canais de informação. Defendo eu que o que nos está a ser mais prejudicial – mais prejudicial ainda que a carga fiscal – é o terrorismo informativo de que estamos a ser vítimas, fruto do mercado concorrencial capitalista aplicado ao jornalismo, que se alimenta dos gostos necrófagos das massas que se querem «informadas».
Irei por isso começar a «coleccionar» citações e provas de outras crises tanto ou mais gravosas que esta, que beneficiaram, no entanto, da lentidão e parcimónia da informação da época.
Note-se que não defendo o controle estatal da informação – nada semelhante à censura – mas gostaria que houvesse bom senso na apresentação das notícias…algo que já percebi que tenho de deixar de almejar.
O texto de hoje inaugura então uma nova etiqueta: Crises outras.
“Já no fim do século dezanove (1898-1899) a região norte foi alertada para um potencial surto de peste bubónica, aquilo a que, correntemente se apelidava de cólera.
(…)
Relativamente ao foco infeccioso do Porto, as notícias chegaram muito rapidamente às vilas e cidades mais próximas que, com razão, temeram o alastramento da epidemia. Dado o alerta geral compreendem-se todos os medos e todas as medidas preventivas tomadas.
Esta medida de encerrar os pontos de entrada e de saída de mercadorias, em especial nos portos mais críticos, provocou uma crise tremenda na economia nacional. Os níveis de desemprego dispararam e a fome chegou a grassar por todo o lado.
Valerá a pena, a título de curiosidade, dizer que esta calamidade cujas causas estavam bem localizadas, foi aproveitada politicamente pelos adversários do governo que não hesitaram em atribuir a culpa ao próprio Rei!”
(Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Barcelos: 125 Anos de serviço, pp. 83-84)
E sempre a política ao serviço da confusão (e dos interesses particulares) e não do «interesse nacional»!

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

O Tempo tem mais olhos que barriga

Com algum tempo sem tempos marcados, dediquei-me hoje às pesquisas que tanto me apaixonam e que - dantes - me mantinham toda a frescura de poder ensinar aos meus alunos a alegria de investigar, de prescrutar a História.
Agora são já as necessidades de cumprir os compromissos assumidos, roubando algum tempo ao descanso, que em tempos de escola, todos os tempos são poucos para cumprir a buroCratice e tentar gerir o número impensável de alunos que o monstro do Ministério da Educação nos atribuiu, para justificar a austeridade num dos Ministérios erroneamente considerados despesista, só para quem não consegue perceber a noção de investimento em capital humano, em qualidade do futuro, em formação.
Entre a Internet, alguns livros e papeis já rascunhados vou lavrando a minha pesquisa.
Procurei Guilherme Cossoul, músico do séc. XIX e "pai" dos Bombeiros Voluntários em Portugal.
Entradas não faltam para o nome que pesquiso, mas, ironia dos tempos, poucas falam do que quero. Guilherme Cossoul é listado (abundantemente listado) pelas iniciativas da Sociedade de Instrução Guilherme Cossoul que, como «ela própria» esclarece, surge da música, mas cresce no teatro e pela travessa Guilherme Cossoul, algures na freguesia da Encarnação, com muitas entradas de pedidos de licenciamento de obras no Arquivo Municipal da Câmara de Lisboa.
Sobre o próprio, a personagem que procuro, o idealista que uma vez abandonou a regência da orquestra de  S. Carlos e combateu um incêndio de sobrecasaca e laço, encontro uma entradita na Wikipédia (retirada do site dos B. V. Lisbonioenses) e a descrição pormenorizada da obra de arquitetura que é o seu jazigo no cemitério dos Prazeres.
Fiquei assim a pensar como as listas da internet espelham um presente que por vezes prega partidas ao passado. Guilherme Cossoul é um nome muito presente, mas poucas entradas assinalam de facto o que ele deixou na História e conduzem-nos num percurso posterior que o seu nome seguiu, afastando-o daquelas que foram as linhas de vida da personagem histórica do séc. XIX.
A toponímia e as iniciativas culturais que nasceram do seu nome fizeram emergir todo um percurso post-mortem que quase esquece as razões de ser do "patrono" da rua, da cultura, de outros tempos... 
E lembrei-me do "estribilho" da canção da Susana Félix: o tempo tem mais olhos que barriga e por vezes devora e transforma uns alimentos da História, devolvendo-os numa 'nouvelle cuisine' quase irreconhecível.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

O Impossível Carinho


"Escuta, eu não quero contar-te o meu desejo
Quero apenas contar-te a minha ternura
Ah se em troca de tanta felicidade que me dás
Eu te pudesse repor
- Eu soubesse repor -
No coração despedaçado
As mais puras alegrias de tua infância!"


Manuel Bandeira  (1886-1968)

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

O tempo é de excessos!
Uns excedem-se em mesuras, outros atiçam amarguras...Nada é calmo nem sereno.
Os computadores não chegam para as urgências de registos deste tempo.
Afadigamo-nos parecendo convivas, quando só queremos que os outros vão à vida e nos deixem cumprir as tarefas que nos toldam o entendimento.
Custa assim ensinar a alegria e a serenidade. Custa assim acreditar que a Escola é um templo do saber. Mais parece um templo em que ao deus se dedicam sacrifícios humanos.

Corri pela ladeira abaixo deixando lá em cima o manicómio da sala de professores, com os autómatos ainda ligados ao tempo do relógio.

Hoje resolvi recuperar o que é meu!
Cheguei a casa e olhei para as paredes, para as estantes e resolvi que tinha o direito de existir, como eu mesma.
Hoje procurei os Poetas, para saber que existiram, que fizeram o mundo, em todas as épocas, que vão voltar e resgatar a Pátria, a Língua, o Ensino, a Cultura, a Paz e a Liberdade.
Porque é para nos libertarem que os Poetas escrevem. Para nos manterem vivos e únicos. Para que as suas palavras possam fazer eco num espírito que é só nosso, onde (ainda) não chegam diretamente os mails com que nos bombardeiam e as muitas instruções com que nos cegam.

Hoje procurei os Poetas. Hoje encontrei os Poetas.

"ESTROFES AO JEITO CLÁSSICO

Dos poetas se diga com justiça
Que os não há antigos ou modernos,
Quem escreve persevera e vai à liça
Que os poetas, em o sendo, são eternos

Fique Dante em Ravena ou no Olimpo
E Camões exilado a oriente
Que o cantar que nos legam é tão limpo
Como a água brotando da nascente

E o poeta que os poetas eterniza
Vertendo na fala de hoje o seu dizer
Muito mais que tradutor é pitonisa
Negando aos grandes o direito de morrer

Clássico é o metro desta lavra
Cintilante no garimpo de outros sons
E o poeta alcandorado na palavra
Rima sempre com a virtude dos seus dons.

José Jorge Letria in a vista desarmada; o tempo largo: antologia (poetas em homenagem a Vasco Graça Moura), Lx, Quetzal, 2012, p. 51

domingo, 9 de dezembro de 2012

Limites e limitações

Uniformização ou diversidade? Muito se discute sobre isto...O direito à diferença, a igualdade de oportunidades...mas um pouco de rumo, linhas orientadoras comuns, que por vezes limitassem as limitações de alguns que decidem também era bom.
Porque parece que existem fronteiras dentro do mesmo país...

Fronteira

De um lado terra, doutro lado terra;
De um lado gente. doutro lado gente;
Lados e filhos desta mesma serra,
O mesmo céu os olha e os consente.

O mesmo beijo aqui; o mesmo beijo além;
Uivos iguais de cão ou de alcatéia.
E a mesma lua lírica que vem
Corar meadas de uma velha teia.

Mas uma força que não tem razão,
Que não tem olhos, que não tem sentido,
Passa e reparte o coração
Do mais pequeno tojo adormecido.


Miguel Torga  (1907-1995)

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Maria Lamas

Cumpre-se hoje o 29º ano sobre a data em que Maria Lamas abandonou fisicamente este mundo.
Uma mulher a quem todos (mas muito particularmente nós, mulheres) devemos muito.
E por isso esta recordação é devida, aqui.

Morreu? Não morre...Curvemo-nos

"Não é o ângulo recto que me atrai, nem a linha recta, dura, inflexível, criada pelo homem. O que me atrai é a curva livre e sensual, a curva que encontro nas montanhas do meu país,
no curso sinuoso de seus rios, nas ondas do mar, no corpo da mulher preferida.
De curvas é feito todo o universo, o universo curvo de Einstein."


Oscar Niemeyer

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Essas Coisas

"Você não está mais na idade
de sofrer por essas coisas".

Há então a idade de sofrer
e a de não sofrer mais
por essas, essas coisas?

As coisas só deviam acontecer
para fazer sofrer
na idade própria de sofrer?

Ou não se devia sofrer
pelas coisas que causam sofrimento
pois vieram lá de fora, e a hora é calma?

E se não estou mais na idade sofrer
é por que estou morto, e morto
é a idade de não sentir as coisas, essas coisas?



Carlos Drummond de Andrade (1902-1988)

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Foi para iso que os poetas foram feitos

"semear tempestades
e assegurar que cresçam
foi para isso que os poetas foram feitos

esgrimir com a mais idónea
das espadas: a coragem
foi para isso que os poetas foram feitos

namorar a perfeição
e às vezes alcançá-la
foi para isso que os poetas foram feitos"


A.M. Pires Cabral, colhido em «a vista desarmada, o tempo largo: Antologia - poemas em homenagem s Vasco Graça Moura», Lx, Quetzal, 2012

domingo, 2 de dezembro de 2012

Como é que os Poetas podem já ter dito tudo o que estamos a sentir...e queremos dizer...e precisamos de dizer?
Já foi dito!
Já tudo foi dito.
Mas do tanto que já foi dito, como é que ainda pode haver tanto por sentir?

Despedida

"Por mim, e por vós, e por mais aquilo
que está onde as outras coisas nunca estão
deixo o mar bravo e o céu tranqüilo:
quero solidão.
Meu caminho é sem marcos nem paisagens.
E como o conheces ? - me perguntarão.
- Por não Ter palavras, por não ter imagem.
Nenhum inimigo e nenhum irmão.
Que procuras ?
Tudo.
Que desejas ?
Nada.
Viajo sozinha com o meu coração.
Não ando perdida, mas desencontrada.
Levo o meu rumo na minha mão.
A memória voou da minha fronte.
Voou meu amor, minha imaginação ...
Talvez eu morra antes do horizonte.
Memória, amor e o resto onde estarão?
Deixo aqui meu corpo, entre o sol e a terra.
(Beijo-te, corpo meu, todo desilusão !
Estandarte triste de uma estranha guerra ... )
Quero solidão."


Cecília Meireles  (1901-1964)