domingo, 5 de agosto de 2018

Parar é...

Este tempo, em que parece não se fazer nada, é de uma importância extraordinária!
Foi de há dois anos para cá que comecei a ser alertada para este facto: precisamos de tempo sem fazer nada para podermos fazer mais coisas.
Parece um paradoxo, mas, quando temos muito que fazer, o melhor é parar.
Descobri-o à força, quando parei, em suores frios e tremuras, em sentimentos de desespero e incompetência, submersa em culpas por precisar de descansar quando tinha tanto para fazer.
O organismo ameaçava desligar-se, recusar-se a trabalhar; cada tarefa era uma chicotada no meu orgulho profissional. Como condenada, arrastava as tarefas como bolas de ferro presas nas grilhetas de ambos os tornozelos. O que aquilo me doía, Deus meu!
Derrotada pelo trabalho como invenção do Homem, foi noutra invenção do Homem que encontrei alívio: antidepressivos, durante mais de um ano.
Mas isso não chegava. Isso era mais uma prova da minha incompetência.
Procurei ajuda. Externa. Creio que fui muito bem assistida, mas...tudo vinha de fora para dentro, quando teria de ser o movimento inverso.
Agora sei que assim é.
Através do Mindfulness, da Yoga e do Tai-Chi, fui compreendendo o que era simples, o que esteve sempre aqui, a simples chave de que respirar da forma correta afasta o medo e coloca tudo no seu lugar. E coloca-me a mim no meu lugar. No lugar da consciência, da decisão, da autodeterminação.
Só por respirar sou dona de mim?
Só por respirar sou dona de mim!
Tento não embarcar nas teorias da conspiração de que a sociedade capitalista nos cria as doenças para nos vender os medicamentos, nos cria as angústias para querermos aliviar o stress e a culpa em jornadas de consumismo, nos cria a ideia do sucesso material para nos manter presos a isso na infindável cadeia de trabalhar-para-ter-dinheiro-para-comprar, cada vez mais, de trabalhar-para-pagar-o-crédito-que-contraímos-para-comprar-aquilo-sem-o-qual-estaríamos-incompletos, porque somos aquilo que temos e nunca somos(temos) o suficiente.
E a pressa, o desespero, impedem-nos de respirar e de assim nos colocarmos de novo no lugar. No nosso lugar. Que sempre foi nosso.
Vem-me à memória o método do filósofo-educador Sócrates: a maiêutica. Está tudo aqui. Sempre esteve. Viemos equipados com tudo o que precisamos. Afinal não precisamos de mais nada. E, provavelmente, de mais ninguém.
A volta que eu dei para concluir que as relações humanas, sobretudo as de amor e posse, me fazem mal, me fazem sofrer!
Será que a invenção do amor romântico também faz parte da conspiração? Para nos sentirmos sempre frustrados? Incompletos? Insatisfeitos? Menos do que devíamos ser?
O dever ser. A normalidade. O padrão. As expectativas.
E agora é Buda que entra nesta conversa: se não houver expectativas não há desilusões.
Mas todos temos expectativas. Ou não? Também nos foram criadas?
Olho horrorizada para a omnipresença na nossa vida daquela pergunta sacramental: O que queres ser quando fores grande?
Porque temos de querer ser qualquer coisa? Porque temos de forçar, de nos esforçar? Porque não deixar acontecer?
Está tanta coisa em ebulição aqui dentro!
Parece que fiz tudo errado até agora. Na realidade fiz o que pude e o que sabia.
Não posso culpar-me. Não posso culpar-me.
Tenho de seguir.
Tenho apenas de fluir, de sentir, de intuir. De fazer aquilo que sempre pude fazer, mas cuja capacidade foi obliterada pela programação de que fui alvo: tenho de saber o que quero e trabalhar para conseguir o que quero. E como as expectativas são altas, a realidade fica aquém; ou o sucesso torna-se num vício e a corrida nunca para, porque parar é morrer.
Ou será que parar é viver?