sábado, 29 de setembro de 2012

Ga-tu

"Há um deus único e secreto
em cada gato inconcreto
governando um mundo efémero
onde estamos de passagem

...Um deus que nos hospeda
nos seus vastos aposentos
de nervos, ausências, pressentimentos,
e de longe nos observa

Somos intrusos, bárbaros amigáveis,
e compassivo o deus
permite que o sirvamos
e a ilusão de que o tocamos."

Manuel António Pina

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Sem título, mas com muita fé

"Nas escolas reside a esperança toda de que, um dia, o mundo seja um condomínio de gente bem formada, apaziguada com a sua condição mortal mas esforçada para se transcender no alcance da felicidade."

Valter Hugo Mãe, Os Professores, Jornal de Letras nº 1095.



     "A escola, como mundo completo, podia ser esse lugar perfeito de liberdade intelectual , de liberdade superior onde cada indivíduo se vota a encontrar o seu mais genuíno, honesto, caminho. Os professores são quem ainda pode, por delicado e precioso ofício, tornar-se o caminho das pedras na porcaria de mundo em que o mundo se tem vindo a tornar.
     (...)
     As escolas não podem ser transformadas em lugares de guerra. Os professores não podem ser reduzidos a burocratas e não são elásticos. Não é indiferente ensinar vinte ou trinta pessoas ao mesmo tempo. Os alunos não podem abdicar da maravilha nem do entusiasmo do conhecimento. E um país que forma os seus cidadãos e depois os exporta sem piedade e por qualquer preço é um país que enlouqueceu. Um país que não se ocupa com a delicada tarefa de educar, não serve para nada. Está a suicidar-se. Odeia e odeia-se."

Valter Hugo Mãe, Os Professores, Jornal de Letras nº 1095.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Guião

Mas porque é que as coisas, na vida real, não acontecem tão depressa (e tão bem) como nos últimos episódios das telenovelas?
Deve ser um problema da equipa de guinistas...Mas também é bom pensar que os últimos episódios ainda estão longe!

terça-feira, 25 de setembro de 2012

domingo, 23 de setembro de 2012

M

E perante os tecidos para escolher, levantei os olhos para ele. Pareceu estupfacto. Como eu esperasse uma resposta disparou: tu é que és mulher!
Empertiguei-me toda de raiva. Que tinha o ser mulher a ver com a coisa? Acaso vínhamos equipadas com um curso de decoração?
A discussão seria muito desagradável na loja e havia uma decisão a ser tomada. Pensei rapidamente: Vale a pena entrares neste "bate-boca"? Ele é nitidamente preconceituoso, mas está a dar-te a primazia da escolha o que te dá legitimidade para qualquer coisa...
Olhei-o ainda de soslaio: parecia hesitante, como se não compreendesse alguma coisa; provavelmente porque é que eu queria a sua opinião.
Decidi rapidamente e nem olhei mais para ele. A situação estava resolvida.
Eu estava incomodada. Apetecia-me explodir, mas nem sabia bem com quê. A sensação que eu tinha é que ele não ia perceber a minha irritação. E nem eu percebia porque estava tão irritada assim.
Agarrámos os sacos. Despedidas feitas. À porta da loja ele espera que eu passe primeiro.
E então eu percebi: é todo um pacote de preconceitos, de ideias feitas, de tratamento preferencial! Preferencial?
Entregámos tudo no escritório à hora combinada. Os outros colegas dariam forma aos cortinados, toalhas, guardanapos e outros acessórios para a festa temática. Nós tínhamos sido apenas "escalados" para a compra dos tecidos, outros o foram para as louças, outros ficaram encarregues da distribuição das mesas, outros da confeção do menu, outros do correto e pronto abastecimento de todos durante a festa, outros da receção e segurança.
Estava tudo certo. Porque estava eu então incomodada? Até tinha ficado com uma função que me agradava. Tecidos entregues não tinha que me preocupar mais com o assunto e não pregaria um alfinete ou sujaria as mãos na massa e no dia da festa podia deambular fresca e comunicativa como eu gostava.
Mas porque é que ele não tinha dado uma opinião? Então servia para quê? Para carregar os sacos? Isso também eu podia fazer. Para me acompanhar? A irritação subia de tom. Para legitimar as minhas escolhas?
Não sabia bem o que me incomodava...
Talvez o facto de me ter sabido bem o seu ato cavalheiro ao dar-me passagem na porta da loja...
O que me incomodava era que eu queria uma parte da imagem de Mulher que ele me oferecia...Mas estão porque fiquei agredida com aquele "tu é que és Mulher!"?
De quem era o preconceito afinal?
Será que na minha cabeça os papeis estavam mesmo referenciados como iguais?
Fiquei confusa e baralhada.
A noite foi carregada de sonhos mais confusos do que conseguia lembrar-me no dia seguinte. Pelos flashes que me vinham à memória poderia concluir - se o quisesse, se o conseguisse admitir - que o que me  incomodava em tudo aquilo era o facto de não lhe ter respondido... porque me congratulava por ele ter assinalado com letra maiúscula que eu era Mulher.
Que disparate! Como se podia dizer, face a um discurso oral, que ele usara maiúsculas? Tudo isto não passava de um disparate pegado. Porque não lhe tinha respondido logo então? Como faria a qualquer outro gajo?
Porque afinal de contas não deixava de ser uma satisfação que ele tivesse notado (e o tivesse dito em voz alta)  que eu era uma mulher, com M maiúsculo, com atributos femininos bem marcados. Bolas! Porque eu já tinha reparado que ele era um homem com H maiúsculo, porque pensava muitas vezes nele, porque queria que ele reparasse em mim e não queria espantá-lo. Pronto, já disse!
O que me incomodava era o facto de me sentir atraída por ele. De ter calado a discussão na garganta "para não espantar a caça". De me sentir vulgar. De me sentir algo animal. De me sentir como há muito tempo não me sentia.
E de me sentir assustada.
Defendia-me antes de tempo daquele M de Mesa posta, de Mãe, de Mulher dito com voz simultaneamente doce e possessiva; de Minha...
Defendia-me de ter sentido qualquer coisa naquela frase, naquele entregar-me os assuntos, naquele confiar em mim, ou dividir as tarefas comigo, naquele estarmos assim: essa é a tua função, poque eu quero que seja, porque a minha será outra: está tudo certo entre nós. Existe um nós...
De quem era o preconceito? Porquê a necessidade de defesa se ninguém me tinha atacado?
O que é que se estava a passar comigo?
Afinal não iria à festa tão descontraída como queria, como pensava que iria. Se ele me atribuía o M maiúsculo gostaria de olhar para uma Mulher bem vestida. Que fazer? Seria capaz?
O M afinal era de Medo, de Muito Medo.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

E eu

que parei uma aula hoje porque alguns alunos estavam a falar em simultâneo, tive de me levantar para desligar a televisão, que estava sintonizada num debate da RTPInformação com representantes dos diversos partidos com assento na Assembleia da República.
O debate estava a ser intercalado com imagens - profusamente ilustradas pelos comentários dos jornalistas - de alguma violência à porta do Palácio de Belém.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Nos sombreados da História

A Liberdade e a Igualdade parecia não estar completa para eles sem a Fraternidade.
Pareceu-me estranho chegarem logo à terceira palavra (conceito).
Afinal a culpa era das moedas "Aquela cena que os franceses têm lá nas moedas".
Foi difícil chegar ao sinónimo que eu queria. Tivemos de passar primeiro pelo amor e a amizade, em afirmações que me pareceram melosas. Queria eu a força da Solidariedade. Encontramo-la; para logo esbarrar no muro erguido por um petiz, desalentado: "Isso não há muito".
"Não há?", questiono.
"Não".
"Porque dizes isso?"
"Vê-se pouco..."
Talvez seja para não se ver...
Talvez isto me esteja a parecer assustador. Para os meus alunos só existe o que se vê na televisão. E a Solidariedade - que existe, felizmente - não existe para ser vista, para se fazer dela um espetáculo. Ou pelo menos, parte dela (a parte genuína, gosto de pensar) não dá nas vistas, é discreta...e por isso não existe nesta sociedade do que se quer mostrar, do que se quer que fique para a História. Essa, que guarda muitas vezes só o que está na fila da frente.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

ESTA GENTE / ESSA GENTE

"O que é preciso é gente
gente com dente
gente que tenha dente
...que mostre o dente

Gente que não seja decente
nem docente
nem docemente
nem delicodocemente
Gente com mente
com sã mente
que sinta que não mente
que sinta o dente são e a mente

Gente que enterre o dente
que fira de unha e dente
e mostre o dente potente
ao prepotente

O que é preciso é gente
que atire fora com essa gente

Essa gente dominada por essa gente
não sente como a gente
não quer
ser dominada por gente

NENHUMA!

A gente
só é dominada por essa gente
quando não sabe que é gente"

Ana Hatherly

domingo, 16 de setembro de 2012

Para todos os que lidam com pessoas

esta frase deveria ser de reflexão obrigatória.
“Todo o mundo é um génio. Mas se você julgar um peixe pela sua habilidade de escalar  uma árvore, ele viverá sua vida inteira acreditando que é estúpido.”
Albert Einstein
Amanhã recomeço o meu trabalho com os adultos do futuro. Amanhã recomeço a dar aulas de História!

sábado, 15 de setembro de 2012

Manif

Foi bonito...foi sobretudo muito emocionante...saber que ainda é possível.
Senti que tinha que lá estar. E estive. E estive inteira. Mas...
Estou céptica, receosa, intrigada. Para mim a política partidária já deu o que tinha a dar. O sistema está podre. Será que estas manifestações na rua são o início de outra coisa? Que outra coisa?
Queria acreditar no poder dos cidadãos, nessa coisa a que agora se chama a sociedade civil, no fim destas continuidades políticas que não são outras coisas senão o perpetuar de um rotativismo bacoco para cumprir tradições, democráticas para uns, oligárquicas para outros, sem sentido para muitos.
Tenho medo de deixar de ter vontade de votar.
Tenho medo de me demitir de acreditar.
Não sei o que se pode fazer. Mas hoje senti que tinha de lá estar. Leiria tinha famílias inteiras no desfile que percorreu as ruas da cidade. Foi calmo, apartidário, sem protagonismos, como cria que iria ser.
Caminhei, conversei, empenhei-me, fiz o meu papel. Mas, no fundo de mim, eu só estava ali para mostrar que não estou de acordo, que temo que este país não aguente, que tudo deixe de ter significado, que eu não consiga ensinar meninos sem esperança e sem alimento, numa escola sobrelotada, onde todos estamos a fazer o que devemos, mas poucos a fazer o que queremos. E o que devemos, é o que nos mandam fazer e não o que sabemos fazer. O que devemos à caminhada que iniciámos em prol do futuro (porque é disso que a Educação trata) por vezes já está sufocado pelo que vamos devendo fazer nas leis sobrepostas dos "senhores que mandam" e passam por lá sem humildade e sem saber que a Educação tem de estar para lá dos partidozinhos que os acolheram no seu seio e os alimentaram.
Eu queria ensinar a alegria de aprender e a possibilidade de crescer. Mas, e se eu própria não conseguir acreditar nisso? Tenho tanto medo de deixar de conseguir acreditar?
Foi esse medo que eu fui exprimir ali, fui explicar que tenho direito à esperança e que o meu dia a dia tem de voltar a ter perspetivas.
Fui à procura da esperança que vi explodir nas ruas a seguir ao 25 de Abril.
Falou-se muito de 25 de Abril. Cantou-se Zeca, a Grândola, proclamou-se que "O povo unido jamais será vencido", chorou-se no hino nacional e nos gritos por Portugal, por nós, pelo que já fomos, pelo que queremos ser, pelo que queremos que nos deixem ser.
Na mochila o livro que me acompanhou o almoço: O Poder dos Muitos: Povo, Classe e Multidão. Mas até esses textos só me agudizaram as interrogações: Quem somos? O que é o Povo? O que temos feito com o poder que temos? Temos?...Que legitimidade tem quem assina por nós? O que é ainda a Democracia?
Hoje estive lá. A mostrar "meu olhar, meu olhar, meu olhar", e meu sentir.
E agora? Que vão eles fazer?
E nós?

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Ouvi

hoje, no rádio, que o Governo reforçou o aparelho de segurança desde que nunciou as novas medidas de austeridade.
E pensei: Coitados dos seguranças! Devem estar a trabalhar em horas remanescentes - como os professores - uma vez que não se pode aumentar as despesas do Estado.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Hoje

tanto o discurso insistiu para não nos concentrarmos demasiado nas pedras do caminho...que creio precisar de umas botas novas reforçadas para este Inverno letivo.

"Dos Ideais a Gente não se reforma"

Esta frase foi destacada numa notícia do JN citando uns reformados de Braga na Festa do Avante.
Pois não. Quando temos ideais eles nunca se reformam: são eles que nos enformam - a nossa maneira de ver o mundo, de nos comportarmos, as posições que tomamos, por vezes nem nos permitem agir de outra forma, pois moldam muito das nossas visões e dos nossos comportamentos.

Depois de uma discussão que vou tendo frequentemente - «Se é legítimo queixarmo-nos do trabalho numa época em que há muito desemprego ou se essa dúvida não estará a acelerar a nossa perda de direitos» - leio o artigo do JN (via Facebook de um amigo) e penso no meu padrasto. Abandonou a militância no partido comunista e nunca nos disse porquê, mas frisou sempre que nunca deixaria (nem podia) de ser comunista.

Fazem-os falta mais pessoas que não se reformem dos ideais!

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Ouvindo o noticiário sobre um Governo que extinguiu o Ministério da Cultura

"Never trust anyone who has not brought a book with them."
Lemony Snicket citado por João Quadros em entrevista à Revista Ler

Saudades

Ao Sul

Praia

Monte Gordo - Algures em Agosto

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Palavrador

"O papel,
antes do poema,
é um chão depois da chuva.

O idioma do grão
lavra a caligrafia do pão."

Mia Couto

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Clic

Cheguei a casa ao fim da tarde, depois da primeira reunião.
Correu bem? Acho que sim...Sobretudo notei que tinha falado menos, colocado menos questões, procurado ser menos incómoda, numa tentativa de sobreviver melhor a este ano, de evitar um desgaste que costuma começar logo nos primeiros dias.
Cheguei calma? Cheguei...mas parece que estava assim...como que anestesiada, dentro de um torpor.
Tomei banho, dei comida à gata e sentei-me aqui para resolver umas questões.
Essas questões ainda estão por resolver - e já chega o cabo do dia, e ainda não jantei - porque, de repente, senti necessidade de me procurar no meu blogue. Talvez tenha sido para isso que o tenho escrito, não sei. Já ri e já chorei. Terei de fazer noitada para resolver as tais questões. Mas já me encontrei!
(Obrigada a quem reencontrei também neste caminho).

Citações...

"Começava a ter medo dos outros.
Aprendia que a nossa solidão nasce
da convivência humana."

Nelson Rodrigues

"As pessoas estão tão habituadas a ouvir mentiras, que sinceridade demais choca, faz com que você pareça arrogante."

Jô Soares

sábado, 1 de setembro de 2012

Contagem Decrescente

E foi o último dia de férias!
Já ocupado com os preparativos do regresso.
Esta sexta-feira fui ao cabeleireiro, à manicure e pedicure (tenho agora as unhas notoriamente azuis e o cabelo mais liso e brilhante) e comprei a Revista Super Interessante, cujo tema de capa é "Pessoas Tóxicas: Aprenda a lidar com Queixinhas, Intriguistas, Medíocres, Manipuladores, Agressivos, Invejosos". Tendo em conta que tenho uma t-shirt por estrear com a inscrição "Back to Cahos", considero que só me falta comprar a Agenda Escolar.