domingo, 9 de janeiro de 2022

Já a minha avó dizia

 Maior fosse o dia maior era a romaria!

sábado, 8 de janeiro de 2022

Criticando o rectângulo pátrio

 Quero aqui registar algumas palavras de crítica ao nosso país, que acho muito bem conseguidas.

São excertos do romance "Fantasia para dois Coroneis e uma Piscina" de Mário de Carvalho.

"Entre a poeirada de adversidades que ensombram e inquinam a já de si pequenina qualidade de vida dos portugueses existe uma prática ilegal e, portanto, livremente exercida, chamada «estacionamento em segunda fila». Consiste em alinhar automóveis ao lado daqueles que já estão arrumados, bloqueando-lhes a saída. Em Portugal, em qualquer ocasião, sempre que ao olhar se oferece um bom lugar, é mister fazer-lhe a crítica e interroga-lo extensamente. Há campo para sair pelo lado do passeio? Há espaço suficiente para?...Convém antecipar todas as malfeitorias aptas a impedir-nos de usar de um direito ou de uma facilidade. Porque é evidente que as circunstâncias da lusa vivência não consentem que um cidadão deixe o seu carro bem estacionado e vá, descansado, à sua vida. Isso seria demasiado simples. E a simpleza repugna aos portugueses. Deixar alguém na despreocupação? A fruir dos seus direitos? Isso é antilusitano. O bom cidadão deve sofrer a grosseria dos seus conterrâneos, sujeitar-se a ver todas as legítimas expectativas malogradas e guardar-se para a sua própria vez, quando tiver ocasião de tirar desforço e lesar triunfalmente a comodidade do próximo." (p. 55)

"(...) Há ocasiões em que Portugal merece ser amaldiçoado. Quando toca a papeis, argueirices, complicações, autoritarismozinhos, sadismozinhos, há que varrer. Eu era mesmo capaz de dizer: invadir. Seiscentos australianos, quarenta suecos e trinta e dois japoneses punham isto na ordem em menos de um fósforo. Alguns dos nossos burocratas, santa paciência!, teriam de aguentar na cadeia ou, pelo menos, com pulseira carcerária, por atentado doloso e mortal à qualidade de vida dos Lusos." (p. 148) 

quinta-feira, 6 de janeiro de 2022

As Mães

 A minha relação com a minha mãe foi muito conturbada, conflituosa, dolorosa. 

Talvez seja isso que tenha determinado que eu nunca tenha tido grande vontade de ser mãe. O tal desejo que dizem que todas as mulheres têm...eu não tive. Pensei ainda (fugazmente) em ser mãe por conta de uma relação amorosa que me parecia que ia dar certo. E aí, sim, talvez eu gostasse de "lhe dar" um filho ou dois, de construir um lar. Não cheguei a saber se essa vontade se teria transformado numa determinação sólida, porque sólida não foi a relação e o projeto ficou pelo caminho, sem ter de ser pensado a valer.

Assim, não fui mãe.

Quando chegou aquela altura do tic-tac biológico (tão bem abordado na comédia de Bridget Jones) ainda encarei a possibilidade de uma adopção...para logo me quedar pela vontade de não enfrentar o calvário burocrático-legal e - sejamos honestos - a trabalheira de criar uma criança.

Assim, não fui mãe.

Agora, com a idade de avó, dou comigo frequentemente a pensar que as mães são seres extraordinários. Que encontram em si recursos insuspeitados, que fazem das fraquezas forças e que povoam gigantescamente (para o melhor e para o pior) a vida dos seus rebentos. Até depois de terem partido.

E vêm estas reflexões a propósito de quê? De facto tenho pensado muito nisto, mas algo fez, hoje, despoletar a vontade de molhar o aparo no tinteiro (Que parvoíce: nunca tive caneta de aparo, mas achei que a expressão ficava aqui tão bem!) e isso foi um breve encontro que tive hoje no café.

Quando já estava para abandonar o espaço do café vi uma colega que já foi outrora minha chefe e isso deteriorou as relações entre nós. (Dizem as más-línguas que eu sou difícil de chefiar, mas eu não concordo com isso, embora a temática seja longa e por isso merecedora de publicação própria). Em resposta ao meu aceno respondeu com um gesto vago, cansado, pouco comprometido. Disse-lhe "Bom Ano", respondeu "Obrigada". Tudo assim sem grande expressão ou implicação.

Mesmo ao cruzar a porta reparo no jovem que se estava a sentar junto dela. Era o filho. Tinha sido meu aluno ainda antes de eu a conhecer como colega. Fiquei ali à espera que ele desse por mim. A mãe fez-lhe sinal e - parecia um milagre! - o rosto dela estava todo iluminado, ela tinha rejuvenescido 10 anos e qualquer antipatia para comigo tinha desaparecido. Ela estava encantada de eu ter reconhecido o filho e querer cumprimentá-lo. Trocámos sorrisos e desejos de boas festas e eu saí do café convencida que a relação entre uma mãe e um filho ou filha é uma coisa com um potencial tremendo: a transformação daquela mãe era disso prova!

Talvez eu tenha perdido a oportunidade de ter uma relação única, para lá do que é imaginável. Porque até a minha mãe, disseram-me, quando falava de mim se animava, se orgulhava, coisa que não me expressava diretamente.

Ser mãe deve ser uma coisa extraordinária!