"Saudade rima com verdade, com amizade, rima com tudo o que acaba em «ade», como prosperidade ou globalidade. Mas também rima com amor, com família e sobretudo, com a vontade inexplicável de percorrer qualquer distância que seja para aliviar esta dor que não se mede com régua nem termómetro.
As saudades não se guardam à espera que passem, simplesmente matam-se."
Carlos Coelho, Mercado da Saudade in Portugal Genial, pp. 111-113
Será que as palavras ficam presas no tempo? Terão as palavras alguma coisa a ver com a moda, efémera e volátil? Evocações do passado também poderão ser palavras que, outrora, marcaram tanto o nosso quotidiano como o som do chiar do baloiço, o pregão da “língua da sogra” na praia ou o cheiro do cozido à portuguesa ao domingo?... Procurar e (re)contextualizar palavras, embalarmo-nos nelas, divagar sobre elas, são alguns dos objectivos deste projecto. Por puro prazer!
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3 comentários:
Ontem, dia 17, foi um dia importante para a igualdade de todos os cidadãos, independentemente da sua orientação sexual. O cadáver ambulante que nos preside lá deixou passar a lei que não obriga ninguém, mas dá liberdade a muitos.
Por isso, deixo aqui um poema de um poeta enorme, que foi perseguido por ter assumido a sua homossexualidade.
Espero que a Escrivaninha não se importe desta minha homenagem.
De saudades vou morrendo
De Saudades vou morrendo
E na morte vou pensando:
Meu amôr, por que partiste,
Sem me dizer até quando?
Na minha boca tão linda,
Ó alegrias cantae!
Mas, quem se lembra d'um louco?
- Enchei-vos d'agua, meus olhos,
Enchei-vos d'agua, chorae!
António Botto
(Claro, com a ortografia anterior ao AO de 1940...)
Mas também deixo um retrato de um poeta também já quase esquecido porque...
A minha saudade tem o mar aprisionado
A minha saudade tem o mar aprisionado
na sua teia de datas e lugares.
É uma matéria vibrátil e nostálgica
que não consigo tocar sem receio,
porque queima os dedos,
porque fere os lábios,
porque dilacera os olhos.
E não me venham dizer que é inocente,
passiva e benigna porque não posso acreditar.
A minha saudade tem mulheres
agarradas ao pescoço dos que partem,
crianças a brincarem nos passeios,
amantes ocultando-se nas sebes,
soldados execrando guerras.
Pode ser uma casa ou uma rede
das que não prendem pássaros nem peixes,
das que têm malhas largas
para deixar passar o vento e a pressa
das ondas no corpo da areia.
Seria hipócrita se dissesse
que esta saudade não me vem à boca
com o sabor a fogo das coisas incumpridas.
Imagino-a distante e extinta, e contudo
cresce em mim como um distúrbio da paixão.
José Jorge Letria
De forma alguma me ia importar que se guardassem por aqui essas palavras.
Foi um passo importante, embora, como em muitas outras coisas, o facto de a igualdade e liberdade estar na lei não faz desaparecer os preconceitos. Mas todas as caminhadas são feitas de muitos passos e este não é sequer o primeiro...
Recordo que deve haver por aqui umas palavras guardadas a respeito do filme Milk, que versa sobre o mesmo assunto e que muito me impressionou. E dá-me o mote para 'postar' mais uma frase daquelas que considero muito grandes.
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