Será que as palavras ficam presas no tempo?
Terão as palavras alguma coisa a ver com a moda, efémera e volátil?
Evocações do passado também poderão ser palavras que, outrora, marcaram tanto o nosso quotidiano como o som do chiar do baloiço, o pregão da “língua da sogra” na praia ou o cheiro do cozido à portuguesa ao domingo?...
Procurar e (re)contextualizar palavras, embalarmo-nos nelas, divagar sobre elas, são alguns dos objectivos deste projecto.
Por puro prazer!
Aquela dália mimosa, Aquele botão de rosa Dos lábios dela... Senhor! Murchavam; mas, como a Lua, Passava a nuvem: «Sou tua»! Reverdeciam de amor!
E aquela estátua de neve Como é que o fogo conteve Que não a vi descoalhar? Ondas de fogo, uma a uma, Naquele peito de espuma Eram as ondas do mar!
Como os seus olhos me olhavam, Como nos meus se apagavam, E se acendiam depois! Como é que ali confundidas Se não trocaram as vidas E os corações de nós dois!
Como hei-de saber o que desejo, Se tudo o que não tenho me apetece? A minha vida é mesmo essa quermesse Negativa. Vivo A sonar ser conviva Doutro banquete.
A insatisfação não se consegue explicar...sente-se. Às vezes escreve-se, às vezes canta-se, às vezes cansa-se. António Variações deixou-nos um bom testemunho disso. Eu gosto particularmente do título: «Estou Além
(...) Esta insatisfacao Nao consigo compreender Sempre esta sensacao Que estou a perder
Tenho pressa de sair Quero sentir ao chegar Vontade de partir P'ra outro lugar
Vou continuar a procurar A minha forma O meu lugar Porque até aqui eu só: Estou bem aonde eu nao estou Porque eu só quero ir Aonde eu nao vou Porque eu só estou bem Aonde eu nao estou Porque eu só quero ir Aonde eu nao vou Porque eu só estou bem Aonde nao estou (...)»
O que me dói É que quando está tudo acabado Pronto pronto Não há nada acabado Nem pronto pronto Pintou-me a casa toda Está tudo limpado O armário fechado A roupa arrumada Tudo belo, perfeito. E no mesmo instante Em que aperfeiçoamos a perfeição Uma lasca diminuta, ténue, microscópica, Não sei onde, Está começando Na pintura da casa E as traças, não sei onde, Estão batendo asas E a poeira, em geral, está caindo invisível, E a ferrugem está comendo não sei quê E não há jeito de parar.
4 comentários:
O poeta achava que mimosa era uma parte importante da vida dele...
Noite de amores
Mimosa noite de amores,
Mimoso leito de flores,
Mimosos, lânguidos ais!
Vergôntea débil ainda,
Tremia! Lua tão linda,
Lembra-me ainda... Jamais!
Aquela dália mimosa,
Aquele botão de rosa
Dos lábios dela... Senhor!
Murchavam; mas, como a Lua,
Passava a nuvem: «Sou tua»!
Reverdeciam de amor!
E aquela estátua de neve
Como é que o fogo conteve
Que não a vi descoalhar?
Ondas de fogo, uma a uma,
Naquele peito de espuma
Eram as ondas do mar!
Como os seus olhos me olhavam,
Como nos meus se apagavam,
E se acendiam depois!
Como é que ali confundidas
Se não trocaram as vidas
E os corações de nós dois!
Mimosa noite de amores,
Mimoso leito deflores,
Mimosos, lânguidos ais!
Vergôntea débil ainda,
Tremia! Lua tão linda,
Lembra-me ainda... Jamais!
João de Deus
Será que o poeta tinha mimo a mais?
Fome indecisa
Como hei-de saber o que desejo,
Se tudo o que não tenho me apetece?
A minha vida é mesmo essa quermesse
Negativa.
Vivo
A sonar ser conviva
Doutro banquete.
Miguel Torga
A insatisfação não se consegue explicar...sente-se.
Às vezes escreve-se, às vezes canta-se, às vezes cansa-se.
António Variações deixou-nos um bom testemunho disso. Eu gosto particularmente do título:
«Estou Além
(...)
Esta insatisfacao
Nao consigo compreender
Sempre esta sensacao
Que estou a perder
Tenho pressa de sair
Quero sentir ao chegar
Vontade de partir
P'ra outro lugar
Vou continuar a procurar
A minha forma
O meu lugar
Porque até aqui eu só:
Estou bem aonde eu nao estou
Porque eu só quero ir
Aonde eu nao vou
Porque eu só estou bem
Aonde eu nao estou
Porque eu só quero ir
Aonde eu nao vou
Porque eu só estou bem
Aonde nao estou
(...)»
Que melhor mimo do que aquele que é acompanhado por um sorriso?
Poeminha de insatisfação absoluta
O que me dói
É que quando está tudo acabado
Pronto pronto
Não há nada acabado
Nem pronto pronto
Pintou-me a casa toda
Está tudo limpado
O armário fechado
A roupa arrumada
Tudo belo, perfeito.
E no mesmo instante
Em que aperfeiçoamos a perfeição
Uma lasca diminuta, ténue, microscópica,
Não sei onde,
Está começando
Na pintura da casa
E as traças, não sei onde,
Estão batendo asas
E a poeira, em geral, está caindo invisível,
E a ferrugem está comendo não sei quê
E não há jeito de parar.
Millôr Fernandes
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