Uma das coisas aborrecidas em ser professora é que quando definimos um trabalho comum a todos os alunos temos depois de ver ou ouvir muuuuuiiiitos trabalhos iguais ou parecidos.
Assim, o trabalho que consistia numa nota biográfica de uma personagem do século XIX, proporcionou-me muitos Thomas Edison(s) e muitos Graham Bell(s), cujas justificações da escolha invariavelmente diziam "porque o que ele fez teve muita importância para o nosso tempo: hoje, na nossa vida, é muito importante a electricidade e o telefone."
E torna-se monótono. Faz parte do pacote...de ser professora...aturar trabalhos muito parecidos...monotonamente parecidos; e perguntas "de aprofundamento" do género: "Ele casou? Teve filhos?"
Pronto...uma pessoa está preparada, já não estranha...
Mas talvez tudo isto torne muito mais refrescante o aparecimento de um trabalho, uma personagem e uma justificação diferente.
Foi hoje, J.D. apresentou-se para expôr o seu trabalho. Era o último da turma, porque, como sempre, adia tudo o que pode, tentando levar sempre a vida a brincar, mas com um espírito fino e agudo, um apurado sentido de humor e de observação.
- Então e a tua personagem é...
- Mendel.
A minha atenção completa e a estranheza da turma por uma personagem que não tinha ainda sido abordada.
- Quem é? Fez o quê?
- É o que eu vou dizer - J.D. deliciado por perceber que tinha público.
Explicou tudo direitinho. O Mosteiro, o jardim, as experiências, ao longo de anos, com as ervilhas, a observação cuidadosa, os resultados ignorados por um mundo impreparado que chama hoje «pai da genética» a um indivíduo que relegou para o desempenho de tarefas burocráticas, amargurando-lhe o fim da vida.
Gostei de recordar que isto dos incompetentes tomarem as rédeas e tratarem como burros todos os que apresentem algo de diferente é quase uma tradição.
Debatemos, explicámos, eu recordei a viagem em que, pela primeira vez, num museu de ciência - do lado de lá do mar - tinha visto uma exposição sobre Mendel; referimos Darwin, as recentes comemorações...
Eu estava encantada.
De repente lembrei-me que faltava fazer a pergunta sacramental: "E porque escolheste esta personagem? Porque te interessaste por ele?"
O rapaz abriu um sorriso franco: "Oh Professora...porque ele se interessou pelas ervilhas...e eu acho que elas são todas iguais."
4 comentários:
:D
(quer isto dizer que me ri - e que verifiquei com agrado o aumento da diferença entre as partículas de felicidade e palavras doridas)
[são esses os breves e mágicos momentos que não nos deixam desistir, não é?]
Magia? Magia é acordar vivo e sonhar acordado...
Síntese da felicidade
Desejo a você
Fruto do mato
Cheiro de jardim
Namoro no portão
Domingo sem chuva
Segunda sem mau humor
Sábado com seu amor
Filme do Carlitos
Chope com amigos
Crônica de Rubem Braga
Viver sem inimigos
Filme antigo na TV
Ter uma pessoa especial
E que ela goste de você
Música de Tom com letra de Chico
Frango caipira em pensão do interior
Ouvir uma palavra amável
Ter uma surpresa agradável
Ver a Banda passar
Noite de lua cheia
Rever uma velha amizade
Ter fé em Deus
Não ter que ouvir a palavra não
Nem nunca, nem jamais e adeus.
Rir como criança
Ouvir canto de passarinho
Sarar de resfriado
Escrever um poema de Amor
Que nunca será rasgado
Formar um par ideal
Tomar banho de cachoeira
Pegar um bronzeado legal
Aprender um nova canção
Esperar alguém na estação
Queijo com goiabada
Pôr-do-sol na roça
Uma festa
Um violão
Uma seresta
Recordar um amor antigo
Ter um ombro sempre amigo
Bater palmas de alegria
Uma tarde amena
Calçar um velho chinelo
Sentar numa velha poltrona
Tocar violão para alguém
Ouvir a chuva no telhado
Vinho branco
Bolero de Ravel
E muito carinho meu.
Carlos Drummond de Andrade
josé luis:
são de facto estes momentos que devolvem a magia, mas está cada vez mais difícil...
Mestre:
Que lindo inventário de partículas de felicidade!...
Mas, se tivéssemos de escolher só algumas?...
Muito carinho meu, para si, também.
Enviar um comentário