Morreu João Aguiar. A literatura portuguesa está de luto.
Mas, como o próprio João Aguiar sabe, um escritor não morre. Para um escritor, a morte é um dos momentos da sua vida, o momento em que deixa de poder estar presente e tomar posições sobre assuntos, para ficar (apenas!) nas opiniões e situações que imortalizou nos seus escritos - o lugar que garantiu na estante da Eternidade.
Eu gosto muito de ler João Aguiar e tem sido um autor que me tem influenciado e ajudado muito:
- nas suas crónicas da Revista Tempo Livre e da Super Interesante, que me deram coragem e modelo para também eu me inspirar numa aventura cronística que durou três anos
- com a colecção infantil «O Bando dos Quatro», quando achei que era preciso incutir no meu sobrinho hábitos e técnicas de leitura
- nas suas «brincadeiras com a História», em obras colectivas como "A República Nunca Existiu", "Eça Agora" ou "O Código de Avintes"
- por puro entretenimento em livros como «O Navegador Solitário» ou «Os Comedores de Pérolas»
- numa escrita que não é História, nem Romance, mas sim uma tradução literária de temas da História muito áridos, num livro que não cansa de me surpreender: Lapedo - Uma Criança no Vale.
Alice Vieira recorda-o como «um príncipe» e eu, que nunca o conheci pessoalmente, também o via assim.
Às vezes sonhava que um dia iria conhecer pessoalmente o João Aguiar, ter coragem de lhe mostrar as minha crónicas e dizer-lhe o quanto e como me influenciou. Agora sei que ele nunca lerá as minhas crónicas. Felizmente eu guardei muitas das dele para me inspirar e tentar escrever cada vez melhor.
Na minha estante João Aguiar vai estar sempre vivo, sempre à mão, para me inspirar, para me ajudar, para me ensinar, para me acompanhar.
Não consigo não ficar triste com a tua morte física, mas sei que vou contribuir para a tua imortalidade, embora não saibas, que a mim, me ajudaste bastante.
Será que se escreve lá do outro lado?... Será que o Paraíso tem mesmo essa componente de Livraria de que falava José Luis Borges?...
Um escritor srá sempre um escritor e o João Aguiar fez muito pela literatura em Portugal, para adultos, infantil, de divulgação e soube narrar muito bem a História.
Eu tinha de fazer uma homenagem, pois as tuas palavras e o teu exemplo marcaram muito a minha vida. Eu tinha que guardar aqui estas palavras. Devia-te isso.
"Justamente, neste fim de tarde, com um Sol já a escorregar para o ocaso, uma criança decidiu partir à aventura, em sua perseguição; porque, no fundo do vale, anoitece mais cedo e para continuar a ver o Sol é preciso ir até ao alto da ribanceira. (...) E como eles são pequeninos, vistos daqui de cima! É agora que ele percebe inteiramente que a distância diminui o tamanho das coisas e das pessoas. Deste ponto onde se encontra, no topo da ribanceira, o acampamento inteiro cabe nas suas mãos. Mais uma das maravilhas que tem vindo a descobrir."
extracto de Lapedo - Uma Criança no Vale, edições ASA, 2006, p. 22
Obrigada, João Aguiar!
1 comentário:
Também me junto ao lamento pela morte de João Aguiar.
Não conheço toda a obra dele, mas o que li gostei bastante e colaborei até na feitura de um dos livros dele – de que fiquei fã ao ponto de já ter comprado para aí uns quatro exemplares e não ter nenhum...
Que não caia no esquecimento!
Enviar um comentário