sexta-feira, 25 de junho de 2010

Distraída ou Selectiva?

Cada vez mais me convenço que a nossa Memória tem diferentes idades (Idades Memoriais...dava um título bonito para qualquer coisa...).
Há uma idade especial para fixar os nomes dos artistas: dos cantores, dos actores...que nos marcam...ou não...
Ora bem, vamos ver se eu me consigo explicar: «dou-me conta» de que, quando era mais nova, fixava com muita facilidade os nomes dos artistas do momento (os que gostava, os que não gostava e os que «tinha dias») e agora só fixo - e com esforço - aqueles que me marcam, a quem tento, conscientemente, homenagear com a minha memória, com evocações frequentes, com referências em público. Depois reparo que os meus sobrinhos e os meus alunos fixam tudo com facilidade, como eu fazia antes. Será que há mesmo uma idade em que absorvemos quase toda a informação e outra em que a filtramos? Estarei a «perder qualidades», por já não fixar tudo, ou a «ganhar competências», retendo apenas o que me interessa? Distraída ou selecctiva?...

E perguntam vocês, porque me deu este ataque de verborreia?
Eu explico (só estava mesmo à espera que perguntassem):
Está aí, em força, a promoção do álbum de regresso de Rita Guerra, artista que me agrada, sem me fascinar. Na respectiva promoção do CD passa frequentemente na rádio a sua música de lançamento «Eu só quero».
Sempre que a ouço tenho a sensação de que ela não está certa, de que aquela música me evoca outra voz, outra toada, uma cadência lânguida e quase miada...e desperta em mim a memória de outros versos:

«Põe os teus braços à volta de mim
leva-me ao cinema, em sessões contínuas...»

Esta música foi-me embalando e embalando, até «acender na minha memória» o nome de Gabriela Schaff, de que eu achava que me tinha esquecido completamente (quer dizer, não achava, porque se achasse era porque sabia...adiante!)
Feita a pesquisa na net lá descobri a moça - um pouquito mais velha que eu - que vive actualmente em Zurique.

Não consegui encontrar o video da canção que me embala, mas encontrei esta pérola - a preto e branco - que não sabia nada que tinha na memória, mas que saiu do armário, limpinha e a brilhar, fascinando-me, mais uma vez, com as capacidades mnemónicas.

10 comentários:

Ninguém.pt disse...

A minha memória ainda é mais... esquecida do que a da Escrivaninha: eu nunca fixei essas coisas.

Não conhecia esta "pérola" e da Gabriela Schaff recordo a belíssima voz que emprestou à Banda do Casaco e que depois, a solo, só cantou trivialidades com pouco sucesso. (Recordo qualquer coisa como "Eu quero um homem muito brasa, para meter na mala e levar para casa" — ou coisa próxima desta pepineira.)

Mais ou menos como aconteceu com as outras solistas da Banda do Casaco: Cândida Branca-Flor e Né Ladeiras, que a solo nunca atingiram o esplendor.

Seria a maldição da Banda do Casaco?

Mas era uma magnífica banda, com uma intervenção cultural e política notável.

A menção escrivânica à Gabriela puxou-me à tona da memória esta beleza:

Natação obrigatória

Viemos do fundapique
passámos no tudasaque
não há mal que mal nos fique
nem há cu que não dê traque
mal a gente vem ao mundo
logo a gente vai ao fundo

Andámos no malsalgado
brigámos no daceleste
e o escorbuto mal curado
com tratamento indigesto
mal a gente vem ao mundo
logo a gente vai ao fundo

[refrão=]
Natação obrigatória
na introdução à instrução primária
natação obrigatória
para a salvação é condição necessária
não há cu que não dê traque
não há cu que não dê traque
mal a gente vem ao mundo
logo a gente vai ao fundo

Pusemos a cachimónia
em papas de sarrabulho
e quando as noites são de insónia
damos voltas ao entulho
mal a gente vem ao mundo
logo a gente vai ao fundo

Aprendizes da política
só na tática do "empocha"
vem a tempestade mítica
e s cabeça dá na rocha
mal a gente vem ao mundo
logo a gente vai ao fundo

[refrão]


António Avelar Pinho

Pode recordar aqui: http://www.youtube.com/watch?v=-MliQHJHqy0

(Já sei, porto-me muito mal!...)

Escrivaninha disse...

A Cândida Branca-Flor fez parte da Banda do Casaco? Quem diria! (Diria quem sabe, claro e eu não digo porque não sei) Disso não me lembro. Aliás lembro-me de algumas coisas da Banda do Casaco, mas não me lembro de quem compunha o grupo...

Afinal isto da memória não funciona sempre. Se calhar sempre foi selectiva, só que os critérios/interesses seriam outros...

Ninguém.pt disse...

Não sei se se poderá dizer "fez parte" (tal como as outras que referi). Acho que mais correcto será dizer "participaram em álbuns" da Banda do Casaco.

Na canção que deixei aqui em cima, esqueci de dizer, a voz feminina é da Né Ladeiras.

Escrivaninha disse...

Lembro-me dessa, que depois também miou umas coisas a solo...

Da canção que refere - «O Homem muito brasa» - lembro-me de um «tele-disco» (!) em que o Hermam José fazia um papel muito ridículo atrás da Schaff, de lânguidos olhos claros e dentinhos tortos, daqueles que conferiam uma certa personalidade, antes da uniformização irritante dos sorrisos de aparelho.

(Isto foi tudo na «época dos CDs gigantes - aqueles pretos, com um grande buraco no meio!» - , segundo uma aluna minha).

Ninguém.pt disse...

Essa dos CD gigantes é boa!

O que diria a sua aluna se tivesse visto (com'amim...) os CD rápidos, aqueles discos de 72 rotações?

(Também me irrita a mania de uniformizar todos os dentinhos...)

Ninguém.pt disse...

Eu escrevi 72 mas eram de 78 rotações... Confusão com os 72 dpi...

(Faz lembrar aquela anedota do ministro batendo na testa e exclamando: "Pois claro, o que ferve a 90 graus é o ângulo recto!")

Escrivaninha disse...

Agora fez-me rir a sério: eu adoro essa anedota!

Eu quando li também pensei que seriam 78 rotações, mas não tinha a certeza. Havia muitos desses lá em casa, eram muito pesados...eu estava proibida de lhes mexer, mas às vezes lá pedia para ouvir qualquer coisa e a minha mãe acedia, mas acho que nunca gostei de nada que lá estivesse.

Esses discos eram guardados religiosamente, num «móvel discoteca» (com divisórias próprias para os discos), encimado por um retrato do meu pai e um busto de Chopin. Agora que falo nisso...tinha um ar muito culto a nossa sala. :-)

Ninguém.pt disse...

Ainda me lembro de ouvir Mario Lanza, por exemplo, a correr a toda a velocidade...

Mas também as Irmãs Meireles, o Marceneiro e outros fadistas, Bettencourt e outros coimbrões.

Depois, por contraste, vieram os lentos: 33 rotações, grandes — isto após os 45 rotações, com duas canções de cada lado ou, quando singles, com apenas uma de cada lado.

Mas nessa altura já os gira-discos eram coisas mais populares — ao contrário do que acontecia com os de 78, geralmente gramofones ainda bem caritos.

Mas o "boom" foram as cassetes (principalmente as piratas)...

josé luís disse...

oh... a banda do casaco...
a natação obrigatória...
saudades...

e desta (a minha preferida) lembram-se?

http://www.youtube.com/watch?v=8Y3mZXkfQak

Ninguém.pt disse...

"Salvé Maravilha", também com a Né Ladeiras — verdadeiramente vanguardista, como aliás, todo o trabalho da Banda.