Fim de semana de adolescentes. Uns representados pelos testes sobre a mesa que se adensam em riscos vermelhos, cruzes, sinais de respostas mortas por falta de estudo; outro, o sobrinho que tem de se "empurrar para o estudo", com ameaças, viistas surpresa, reprimendas e todo um rol de indisposições familiares que se evitavam com um pouquinho de atenção ao que se diz e ao que é preciso fazer.
Dantes nao sentia tanto desespero na profissão de professora e na função de tia.
O que mudou?
Fui só eu que cresci?
Tento rebuscar na memória como era quando estudante. Não era nenhum mimo, mas...sabia o que tinha de fazer e nunca ninguém teve de ter tanto trabalho comigo.
Faço o quê? Parece que nem nos devemos queixar... Acusamos fraqueza e passamos mal-estar. Mas eu sinto-me mal, por isso também não me apetece passar outro sentimento. Serei queixinhas, derrotista...derrotada? Assustada, muito assustada com o rumo que isto leva.
"Ah, só
Ah, só eu sei
Quanto dói meu coração
Sem fé nem lei,
Sem melodia, nem razão.
Só eu, só eu,
E não o posso dizer
Porque sentir é como o céu
Vê-se mas não há nele que ver."
Fernando Pessoa
1 comentário:
Pois é, o mundo muda mais ou menos como soía, mas a memória não é a mais fiel das companhias...
MÁ MEMÓRIA
Copla 1
A cabeça é um órgão curioso
Curiosamente organizado
Basta ver quando nos fazem uma trepanação
Geralmente não é muito fácil
Eis a história singular
De um certo Mathurin Lafieur
Cujo crânio bastante comum
Só era bizarro no interior
Este tipo sofria desde a infância
De um mal na verdade vulgar
De uma memória tão infiel
Que causava embaraços
Assim que aprendia uma coisa
Em família ou no liceu
Mathurin de expressão tristonha
Imediatamente a esquecia
Mas...
Refrão 1
Em breve se esqueceu de esquecer
O que devia esquecer
Então como se tinha
Esquecido de esquecer
De tudo se recordava
(Falado) Estão a perceber
Copla 2
Esta faculdade tão rápida
Em lugar de na sociedade
O fazer considerar estúpido
Dava-lhe a prioridade
Esquecendo-se de esquecer as aulas
Mathurin sabia-as de cor
E apesar do cérebro atravancado
Chegou sem custo a agregado
Mas um dia em que chovia um horror
E que ele ia a correr para o metro
Esbarrou num outro corredor
E estatelou-se como um perdigoto
O crânio bateu na pedra
Com um belo ruído musical
Produzindo-lhe na cafeteira
Uma reviravolta fatal
E desde então
Refrão 2
Esquecia-se de esquecer de esquecer
O que tinha de esquecer
E como se esquecia
De se esquecer de esquecer
Nunca se lembrava de nada
(Falado) Estão a perceber
Copla 3
Esvaziado pelo estúpido acidente
Das suas memórias de sempre
Partiu prà Praça das Festas
Ele que morava em Cherbourg
Mas no caminho azar infame
Um autocarro desarvorado
Sem contemplação pla sua alma
Diante de Mathurin desembocou
Tendo esquecido a existência
Dos autocarros e do perigo
O nosso herói flor de inocência
Entregou-se ao monstro raivoso
Sucumbindo às rodas carniceiras
No seu crânio houve o sentimento
De uma distorção estranha
Antes de conhecer o esquecimento
E
Esqueceu-se de se esquecer de esquecer
De esquecer que devia esquecer
O que se esquecia de esquecer de esquecer
Que acabava de recordar
(Paragem) Esqueci-me do fim...
Boris Vian
Beijito, Miss, e lindas recordações.
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