terça-feira, 26 de março de 2013


 Agora o corpo é mais um barco que se solta.
Nele navegam primeiro os olhos e os receios.
...
E só depois a polpa dos dedos, à deriva, que
é quem faz o sabor das ondas nesse mar.

Levamos-lhe uma luz que é como uma promessa:
uma pequena chama azul e inquieta que treme
dentro das mãos e faz a boca abrir-se para
a espera. E não sei o que longe da margem

ilumina depois os nossos gestos: talvez
apenas a pele prateada dos peixes, o fulgor
da lua sobre a água como um gomo cheio
a desafiar os lábios, os reflexos do frio
metal das âncoras sob o olhar das estrelas.

Repara como de repente ficou distante o cais
e o outro barco amarrado ao sono da noite.
Esquece-o para sempre. Agora, adormeçamos
simplesmente, docemente, em casas de sal.


Maria do Rosário Pedreira

2 comentários:

josé luís disse...

lindo como sempre

Escrivaninha disse...

Sempre fã!
Já percebi que basta um Pedreira para saber de si.

Boa Páscoa!