Será que as palavras ficam presas no tempo?
Terão as palavras alguma coisa a ver com a moda, efémera e volátil?
Evocações do passado também poderão ser palavras que, outrora, marcaram tanto o nosso quotidiano como o som do chiar do baloiço, o pregão da “língua da sogra” na praia ou o cheiro do cozido à portuguesa ao domingo?...
Procurar e (re)contextualizar palavras, embalarmo-nos nelas, divagar sobre elas, são alguns dos objectivos deste projecto.
Por puro prazer!
domingo, 2 de dezembro de 2012
Como é que os Poetas podem já ter dito tudo o que estamos a sentir...e queremos dizer...e precisamos de dizer?
Já foi dito!
Já tudo foi dito.
Mas do tanto que já foi dito, como é que ainda pode haver tanto por sentir?
Não me parece que já tudo tenha sido dito — porque o resultado de dizer é apenas gerar ondas sonoras que se perdem se não houver receptor.
E, mais ainda, cada conjunto de ondas terá uma interpretação diferente consoante o receptor, consoante o ambiente, consoante a disposição e o momento.
O conjunto de ondas geradas pela verbalização da palavra "flor", por exemplo: • gerará um sorriso de felicidade se o receptor tiver dentro de si a Primavera; a flor enquadrar-se-á no clima ameno, florido, esperançoso — mesmo que seja Inverno; • gerará um esgar de espanto se surgir no meio de uma disposição invernosa, sombria, macambúzia, do receptor — por muito florido que esteja o ambiente; • será esperança se o receptor estiver ansioso à procura de qualquer coisa, de um sinal onde possa agarrar-se — por muito desesperada que seja a situação; • será desilusão se, embora dizendo o contrário, o receptor desejar um sinal negativo — "preciso de um caule para me agarrar e surge esta insignificante flor"... • será mil e uma outras coisas, quase todas ditas, quase todas ouvidas, quase todas sofridas por quase todos nós...
... mas será sempre uma conjugação diferente aquela em que seremos o receptor da palavra "flor" — é esse o mistério da vida, é esse mistério que ela compartilha com a poesia.
Por isso eu costumo dizer que não há apenas uma versão do poema que o poeta deixou: há uma para cada uma das nossas disposições, sempre diferente e sempre adaptando-se ao que sentimos no momento — é assim que se reconhece a excelência do que está escrito.
OS POEMAS
Os poemas são pássaros que chegam não se sabe de onde e pousam no livro que lês. Quando fechas o livro, eles alçam voo como de um alçapão. Eles não têm pouso nem porto alimentam-se um instante em cada par de mãos e partem. E olhas, então, essas tuas mãos vazias, no maravilhado espanto de saberes que o alimento deles já estava em ti…
Mário Quintana
Beijito, Miss. (Desculpe o arrazoado acima, é febre...)
2 comentários:
Não me parece que já tudo tenha sido dito — porque o resultado de dizer é apenas gerar ondas sonoras que se perdem se não houver receptor.
E, mais ainda, cada conjunto de ondas terá uma interpretação diferente consoante o receptor, consoante o ambiente, consoante a disposição e o momento.
O conjunto de ondas geradas pela verbalização da palavra "flor", por exemplo:
• gerará um sorriso de felicidade se o receptor tiver dentro de si a Primavera; a flor enquadrar-se-á no clima ameno, florido, esperançoso — mesmo que seja Inverno;
• gerará um esgar de espanto se surgir no meio de uma disposição invernosa, sombria, macambúzia, do receptor — por muito florido que esteja o ambiente;
• será esperança se o receptor estiver ansioso à procura de qualquer coisa, de um sinal onde possa agarrar-se — por muito desesperada que seja a situação;
• será desilusão se, embora dizendo o contrário, o receptor desejar um sinal negativo — "preciso de um caule para me agarrar e surge esta insignificante flor"...
• será mil e uma outras coisas, quase todas ditas, quase todas ouvidas, quase todas sofridas por quase todos nós...
... mas será sempre uma conjugação diferente aquela em que seremos o receptor da palavra "flor" — é esse o mistério da vida, é esse mistério que ela compartilha com a poesia.
Por isso eu costumo dizer que não há apenas uma versão do poema que o poeta deixou: há uma para cada uma das nossas disposições, sempre diferente e sempre adaptando-se ao que sentimos no momento — é assim que se reconhece a excelência do que está escrito.
OS POEMAS
Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam voo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto
alimentam-se um instante em cada par de mãos
e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti…
Mário Quintana
Beijito, Miss.
(Desculpe o arrazoado acima, é febre...)
Não é a febre de qualquer um que fala assim...
Beijito, Mestre.
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