terça-feira, 31 de julho de 2012

Encontro de Verão

- Olha...eu tinha uma aluna igualzinha a ti, só que era branca.
- Oh, s'tôra! É Verão. É tempo de praia.
Ela estava visivelmente lisongeada, com o cabelo encaracolado, desalinhado e o magnífico bronzeado potenciado pelo vestido branco.
Engraçado...foi uma aluna com que pouco comuniquei: turma muito grande, feitio introvertido, só uma aula por semana. Fico sempre muito honrada e feliz quando vejo que atravessam a rua para me falar, mesmo quando são alunos menos comunicativos.
Dei-lhe uma palmada no ombro e continuei com a brincadeira: - É impossível que não sjam família, são iguais. Se vires por aí a minha aluna dá-lhe um abraço da professora de História e diz-lhe que a praia também é um bom sítio para ler um livro.
Ela sorriu. Eu retomei o meu caminho, do qual, aliás, raramente me desvio.

5 comentários:

Ninguém.pt disse...


VERÃO


O terraço da casa era o prodígio,
nele passava o vento.
Eu começara a descobrir o corpo e tinha
a luz por confidente.

O tempo pousava devagar nos muros altos,
era verão, na minha insónia
ao mar oferecia os meus cavalos:
ao tocarem a água gritava de pavor,

ou talvez de amor, já não sei bem.
Viver então
era crescer com uma flor entre os dentes,
aprender a respirar com o perigo

de a pele estalar num clarão a cada passo.


Eugénio de Andrade

Beijito, Miss. Boas férias.

Ninguém.pt disse...


COMO SE O VENTO…


como se o vento trouxesse
recados
que pudesse abandonar
ao serviço do mensageiro

como se o vento te pudesse
levar e as palavras transformar
no milagre da cerejeira

não descuides o vento
que quem uiva
é lobo faminto

rodeia-te antes do essencial
faz-te cozinheira, semeia o teu quintal

o que por natureza rola
há-de rolar
e tu sozinha
o que podes contra o vento?


Ana Paula Inácio

Mesmo sozinhos, cumpre-nos enfrentar os ventos adversos, aqueles que nos empurram para onde não queremos ir — apenas para irmos por onde nos der na realíssima gana.
Beijito, Miss.

Ninguém.pt disse...


DE VERÃO


I
No campo; eu acho nele a musa que me anima:
A claridade, a robustez, a acção.
Esta manhã, saí com minha prima,
Em quem eu noto a mais sincera estima
E a mais completa e séria educação.

II
Criança encantadora! Eu mal esboço o quadro
Da lírica excursão, de intimidade,
Não pinto a velha ermida com seu adro;
Sei só desenho de compasso e esquadro,
Respiro indústria, paz, salubridade.

III
Andam cantando aos bois; vamos cortando as leiras;
E tu dizias: «Fumas? E as fagulhas?
Apaga o teu cachimbo junto às eiras;
Colhe-me uns brincos rubros nas gingeiras!
Quanto me alegra a calma das debulhas!»

IV
E perguntavas sobre os últimos inventos
Agrícolas. Que aldeias tão lavadas!
Bons ares! Boa luz! Bons alimentos!
Olha: os saloios vivos, corpulentos,
Como nos fazem grandes barretadas!

V
Voltemos. Na ribeira abundam as ramagens
Dos olivais escuros. Onde irás?
Regressam rebanhos das pastagens;
Ondeiam milhos, nuvens e miragens,
E, silencioso, eu fico para trás.

VI
Numa colina azul brilha um lugar caiado.
Belo! E arrimada ao cabo da sombrinha,
Com teu chapéu de palha, desabado,
Tu continuas na azinhaga; ao lado
Verdeja, vicejante, a nossa vinha.


Cesário Verde

Beijito, Miss.

Ninguém.pt disse...


CONFIM


Sonda-se uma e outra vez
entre os restos do naufrágio.
E depõe-se a colheita
uma vez e outra
na lâmina polida da margem.
O que é que fica de fora?
A espuma que sobra das mãos
ou o oceano denso da linguagem?


Ana Rossetti

Beijito, veraneante.

Escrivaninha disse...

Obrigada Mestre.
Tão bom poder ler todas estas palavras à chegada de uma pequena viagem pelo país, o nosso país. Impossível que não gerasse poetas.
Volto com os olhos rasos da emoção, do orgulho de ser portuguesa.
E que venham as troikas, os senhores, os doutores, as chocas, os guizos e os capotes.
Este é um país maravilhoso.
E na objetiva da máquina fui escrevendo os poemas que não sei, mas sinto, que vivo no meio de um povo sincero, prestável e carinhoso.
E no Norte sou sempre 'menina', estou sempre de férias e sinto-me sempre bem acolhida.