- Olha...eu tinha uma aluna igualzinha a ti, só que era branca.
- Oh, s'tôra! É Verão. É tempo de praia.
Ela estava visivelmente lisongeada, com o cabelo encaracolado, desalinhado e o magnífico bronzeado potenciado pelo vestido branco.
Engraçado...foi uma aluna com que pouco comuniquei: turma muito grande, feitio introvertido, só uma aula por semana. Fico sempre muito honrada e feliz quando vejo que atravessam a rua para me falar, mesmo quando são alunos menos comunicativos.
Dei-lhe uma palmada no ombro e continuei com a brincadeira: - É impossível que não sjam família, são iguais. Se vires por aí a minha aluna dá-lhe um abraço da professora de História e diz-lhe que a praia também é um bom sítio para ler um livro.
Ela sorriu. Eu retomei o meu caminho, do qual, aliás, raramente me desvio.
5 comentários:
VERÃO
O terraço da casa era o prodígio,
nele passava o vento.
Eu começara a descobrir o corpo e tinha
a luz por confidente.
O tempo pousava devagar nos muros altos,
era verão, na minha insónia
ao mar oferecia os meus cavalos:
ao tocarem a água gritava de pavor,
ou talvez de amor, já não sei bem.
Viver então
era crescer com uma flor entre os dentes,
aprender a respirar com o perigo
de a pele estalar num clarão a cada passo.
Eugénio de Andrade
Beijito, Miss. Boas férias.
COMO SE O VENTO…
como se o vento trouxesse
recados
que pudesse abandonar
ao serviço do mensageiro
como se o vento te pudesse
levar e as palavras transformar
no milagre da cerejeira
não descuides o vento
que quem uiva
é lobo faminto
rodeia-te antes do essencial
faz-te cozinheira, semeia o teu quintal
o que por natureza rola
há-de rolar
e tu sozinha
o que podes contra o vento?
Ana Paula Inácio
Mesmo sozinhos, cumpre-nos enfrentar os ventos adversos, aqueles que nos empurram para onde não queremos ir — apenas para irmos por onde nos der na realíssima gana.
Beijito, Miss.
DE VERÃO
I
No campo; eu acho nele a musa que me anima:
A claridade, a robustez, a acção.
Esta manhã, saí com minha prima,
Em quem eu noto a mais sincera estima
E a mais completa e séria educação.
II
Criança encantadora! Eu mal esboço o quadro
Da lírica excursão, de intimidade,
Não pinto a velha ermida com seu adro;
Sei só desenho de compasso e esquadro,
Respiro indústria, paz, salubridade.
III
Andam cantando aos bois; vamos cortando as leiras;
E tu dizias: «Fumas? E as fagulhas?
Apaga o teu cachimbo junto às eiras;
Colhe-me uns brincos rubros nas gingeiras!
Quanto me alegra a calma das debulhas!»
IV
E perguntavas sobre os últimos inventos
Agrícolas. Que aldeias tão lavadas!
Bons ares! Boa luz! Bons alimentos!
Olha: os saloios vivos, corpulentos,
Como nos fazem grandes barretadas!
V
Voltemos. Na ribeira abundam as ramagens
Dos olivais escuros. Onde irás?
Regressam rebanhos das pastagens;
Ondeiam milhos, nuvens e miragens,
E, silencioso, eu fico para trás.
VI
Numa colina azul brilha um lugar caiado.
Belo! E arrimada ao cabo da sombrinha,
Com teu chapéu de palha, desabado,
Tu continuas na azinhaga; ao lado
Verdeja, vicejante, a nossa vinha.
Cesário Verde
Beijito, Miss.
CONFIM
Sonda-se uma e outra vez
entre os restos do naufrágio.
E depõe-se a colheita
uma vez e outra
na lâmina polida da margem.
O que é que fica de fora?
A espuma que sobra das mãos
ou o oceano denso da linguagem?
Ana Rossetti
Beijito, veraneante.
Obrigada Mestre.
Tão bom poder ler todas estas palavras à chegada de uma pequena viagem pelo país, o nosso país. Impossível que não gerasse poetas.
Volto com os olhos rasos da emoção, do orgulho de ser portuguesa.
E que venham as troikas, os senhores, os doutores, as chocas, os guizos e os capotes.
Este é um país maravilhoso.
E na objetiva da máquina fui escrevendo os poemas que não sei, mas sinto, que vivo no meio de um povo sincero, prestável e carinhoso.
E no Norte sou sempre 'menina', estou sempre de férias e sinto-me sempre bem acolhida.
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