domingo, 29 de setembro de 2013

A importância do ato eleitoral

Hoje, horário matinal de domingo, dirigi-me ao café do costume para tomar um pequeno-almoço quentinho antes dos afazeres para o dia. Um dos afazeres era, obviamente, votar. E era esse o assunto de conversa no café.
Por entre posições diversas - havia quem declarasse que não ia votar, nunca ia - recordavam-se outras eleições anteriores.
As primeiras!
Vários de nós referimos a extraordinária afluência às urnas nas primeiras eleições em Liberdade. Eu era garota, mas também fui, integrando a briosa comitiva familiar, já exclusivamente feminina por essa altura.
A minha mãe, como sempre, registou em fotografia o Momento: o Grande Momento.
Comentávamos o entusiasmo, a indumentária de festa, o cuidado e o civismo colocado em tudo. Estávamos até emocionados, enquanto evocávamos tais momentos.
- Onde nos perdemos tanto? - pensei.
Falhada a tentativa de demover a cidadã abstencionista, lá voltei a vestir a gabardina e entrei no carro, que a votação era apenas a primeira tarefa de outras mais longínquas.
Quando estacionei em frente à escola primária, demorei ainda um pouco no carro, enquanto procurava a carta que tinha recebido em relação ao ato eleitoral - o novo nº de eleitora - o cartão de cidadã e uma caneta, que a minha mãe também sempre dizia que devíamos levar a nossa caneta: a nossa melhor caneta. Afinal seria muito triste que a tinta fraquejasse em momento tão singular.
Encontrados os documentos, levanto os olhos para uma família que regressava da votação. Deveriam ser os avós e os netos, pela diferença de idade. As garotas levavam umas bonecas, a senhora guardava os documentos na carteira e o senhor, com a máxima solenidade, arrancou os dentes postiços da boca e guardou-os num lenço ou guardanapo de papel.
Quedei-me abismada. Depois sorri, verdadeiramente contente: afinal as eleições são ainda momentos solenes e especiais, dignos até de usar os dentes que se guardam novinhos em casa, que são caros e incomodam no dia a dia.

1 comentário:

Ninguém.pt disse...

˚
Que distraídos somos! Quão depressa esquecemos os que tombaram para que pudéssemos, sorrindo e não temendo, escolher quem queremos que nos governe!

Todos os que tombaram, e também aqueles que "apenas" foram torturados, os que foram impedidos de exercer as suas actividades profissionais, os que foram empurrados para o exílio — todos esses merecem que votemos, para que não tenha sido em vão tudo o que sofreram.

Que ingratos somos!

E que esquecidos, também. Porque deveríamos todos ir votar nem que fosse apenas em homenagem à alegria que todos sentimos quando o pudemos fazer livremente pela primeira vez.

Eu nunca esquecerei: bichas enormes, todo o povo de fato domingueiro, todo o povo sorrindo e exibindo o cravo vermelho que certificava que aquele era um 25 de Abril em que, finalmente, todos iríamos dar a nossa opinião e (coisa nunca antes vista!) que ela seria tomada em conta, seria ela que valeria e não a ordem de um qualquer ditadorzeco.

Foi bonita a festa, pá! E quando recordo esse dia ainda me cheira ao alecrim de que fala o Chico, misturado com o cheiro apimentado de um cravo vermelho.

Foi bonita a festa, pá! Que pena que cada vez menos gente vá a essa festa!