sábado, 8 de março de 2014

Condição Feminina

Diria que durante anos fomos uma família só de mulheres, mas não é verdade. No entanto é assim que recordo a família durante a minha infância e adolescência, em que na realidade havia ainda um avô, mas não tem nas minhas memórias a estatura dos outros homens da família que se foram.
A morte ceifou cedo o meu pai e pouco tempo depois o meu avô, seu pai, seguiu-o lá para a eternidade, visto que era já quase só uma sombra desde que o filho - o seu único filho - partira.
As mulheres ficaram sós. Vestiram-se de luto e endureceram as feições. Era preciso continuar. Continuar sem eles. Continuar como eles. Aprender a fazer o que lhes estava reservado: passar um cheque, conduzir, gerir, decidir, assumir a responsabilidade por essas decisões.
Saíram-se bem.
A família singrou. As mais pequeninas da altura encaminharam-se na vida e hoje todas nos podemos orgulhar de sermos mulheres inteiras. Já nasceram mais duas que parecem também muito capazes e com todas as condições para assumirem o controlo das suas vidas.
Por detrás do desgosto que toldava as suas vidas recordo o esforço e a incompreensão das mulheres viúvas da minha família para/por aprenderem tão tarde a tomar as rédeas de vidas e famílias.
Para mim essa incompreensão e esse inconformismo são a imagem da condição feminina no Estado Novo.

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